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+ Marcelo Gleiser
50 anos da era espacial
O mundo hoje depende dos satélites de comunicação, heranças do Sputnik
No dia 4 de outubro de 1957,
cientistas soviéticos mudaram
a história. Nesse dia, o primeiro satélite artificial -um objeto criado
por mãos humanas capaz de girar em
órbita da Terra- foi lançado ao espaço. A pequena esfera metálica, pesando em torno de 90 quilos, circundou a
Terra 14 vezes por dia, viajando a quase 30 mil km/h a uma altitude de 940
km. O feito causou ondas de choque
pelo mundo, especialmente nos EUA.
Em meio à Guerra Fria, a tensão entre os americanos e os soviéticos era
explosiva. O fato de os soviéticos terem desenvolvido foguetes capazes de
lançar objetos de cem quilos ao espaço
significava que poderiam facilmente
armá-los com explosivos nucleares.
O lançamento do Sputnik marca
não só o início da corrida espacial como, também, o de uma plausível guerra nas estrelas. O mundo todo ouviu
os sons de rádio em duas freqüências:
"bip, bip". Um som vindo do espaço,
criado pelos homens. Para quem não
era soviético, aquilo era assustador.
No dia 6 de novembro, os soviéticos
ampliaram o feito, lançando o Sputnik-2. Pesando dez vezes mais do que
o Sputnik-1, esse satélite levou o primeiro ser vivo da Terra ao espaço, a
cadela Laika.
Os americanos tentaram responder
à altura. No dia 6 de dezembro do
mesmo ano, equipes de jornalismo foram convidadas ao Cabo Canaveral
para registrar o lançamento do primeiro satélite americano. Após subir
menos de dois metros, o foguete explodiu, causando um vexame nacional
e muita gozação dos soviéticos. O feito
americano foi logo apelidado de
"Flopnik", "Dudnik", "Kaputnik".
No dia 31 de janeiro de 1958, Werner von Braun salvou a situação.
Usando um foguete Júpiter C, Von
Braun lançou o primeiro satélite norte-americano em órbita, o Explorer-1.
Desta vez, a imprensa não foi convidada. O satélite, munido com um contador Geiger, registrou pela primeira
vez evidência de que a Terra é cercada
por cinturões de partículas carregadas, aprisionadas pelo campo magnético terrestre, os cinturões de Van
Allen. O espaço não era apenas palco
de ameaças bélicas; era, também, um
gigantesco laboratório científico, esperando para ser explorado.
Uma mistura de prestígio e vaidade
nacional empurraram os programas
espaciais americano e soviético. Mais
uma vez, foram os soviéticos que assumiram a liderança: Yuri Gagárin circundou a Terra no dia 12 de abril de
1961. O homem não estava mais preso
ao seu planeta-mãe.
Os americanos tinham de fazer algo,
e rápido. No dia 25 de maio de 1961,
John Kennedy anunciou que o objetivo principal da recém-criada Nasa era
"levar um homem à Lua e retorná-lo,
são e salvo, à Terra". O sucesso da missão Apollo foi tremendo. Lembro-me
de assistir, com meus primos, ao astronauta Neil Armstrong dando seus
primeiros passos na Lua, no dia 20 de
julho de 1969. A bandeira americana,
rígida, foi fincada em solo alienígena.
Passados 50 anos, sondas espaciais
exploram mundos nos confins do sistema solar e até além, com as missões
Voyager-1 e 2. Mas muitos dos sonhos
que tantos tinham ainda não foram
realizados: a exploração humana de
Marte, colônias espaciais, viagens tripuladas até as estrelas. Após a Lua, faltou a continuação do simbolismo mítico de ir além, de explorar o desconhecido. Os custos são imensos, os riscos e desafios tecnológicos também.
Mas convém lembrar que o mundo
hoje depende de modo essencial dos
satélites de comunicação, dos aparelhos de GPS, todos heranças do Sputnik. Nossa visão cósmica mudou após
o telescópio espacial Hubble. Estamos
ainda dando os primeiros passos; a
jornada até as estrelas é longa.
MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA) e autor do livro "A Harmonia do Mundo"
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