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Tenente comandou sessão contra suspeito, que teve dedo amputado, e foi expulso da corporação; ele recorreu
PM exemplar é 1º oficial preso por abuso
DA REPORTAGEM LOCAL
"Soube dignificar e honrar o
uniforme que veste, enaltecendo
o nome da corporação e sendo alvo de admiração de seus superiores e exemplo a ser seguido por
seus pares e subordinados", diz
apenas um dos 32 elogios no currículo do oficial da Polícia Militar.
São parabenizações por prisões
de ladrões e traficantes, trabalho
extra em horários de folga, dedicação em eventos da PM e até participação em campanhas de doação de sangue.
Um perfil que, em 1998, fez do
2º tenente Paulo Sérgio dos Santos, então com 31 anos, recém-saído do curso de formação, onde teve aulas de direitos humanos, um
policial promissor.
Quatro anos depois, porém, ele
entrou para a história da corporação de uma forma nada gloriosa.
Ele foi o primeiro oficial da PM a
ser condenado pelo crime de tortura. A pena de nove anos e oito
meses de prisão foi decretada pela
19ª Vara Criminal de São Paulo.
Santos foi expulso da PM.
Para o promotor de Justiça Alfonso Presti, que denunciou Santos, a história do oficial exemplar
que comandou uma sessão de
tortura mostra algumas particularidades desse tipo de crime. "Ele
tinha formação, mas sucumbiu
em um momento emocional. Mas
nada justifica o fato de torturar
uma pessoa", disse.
Para o ouvidor da Polícia de São
Paulo, Itajiba Farias Ferreira Cravo, o caso mostra a vigência de
uma forma antiga de atuação. "O
policial tem de ter força de vontade para não seguir o espírito que
gosta de dizer: aqui na rua, tudo é
diferente", afirmou.
O cenário da sessão de tortura
foi a própria base comunitária da
PM, no Jardim Ranieri (zona sul
de São Paulo), segundo sentença
do Marcelo Martins Berthe, que
condenou, em 2002, Santos e o
soldado da PM Carlos Alberto Iris
de Jesus pelo crime. Dois outros
PMs foram absolvidos.
Santos comandava o patrulhamento no dia 10 de janeiro de
2000, quando o rádio da PM comunicou a prisão de dois jovens
armados, que poderiam estar envolvidos na morte de um PM
ocorrida dias antes. Marcelo Luciano Kara foi assassinado em um
assalto quando fazia bico num
empresa da região.
A suspeita contra os jovens surgiu, segundo declarou Santos em
depoimento, pelo fato de os dois
terem sido detidos próximo ao local onde Kara fora assassinado.
Em vez do distrito policial, os
dois jovens foram levados para o
prédio da base comunitária da
PM. Por horas, foram submetidos
a agressões, sessões de asfixiamento com uso de sacos plásticos
e choques elétricos, segundo argumentação do Ministério Público aceita pela Justiça.
Marcelo Costa Pereira, então
com 19 anos, teve um dedo amputado em decorrência das queimaduras provocadas pelos choques.
Segundo ele disse em depoimento, os PMs queriam que ele confessasse. Depois, que informasse o
paradeiro de outros jovens. Um
deles foi morto pelos PMs em
uma suposta resistência à prisão.
Pereira só foi indiciado por porte ilegal de arma. Até hoje não são
conhecidos os reais assassinos do
PM. O inquérito que apurava sua
morte foi arquivado em 2001. A
morte do jovem na suposta resistência está sendo investigada.
"A tortura é assim. Além do tratamento desumano, é um método
investigativo ineficaz, que não
traz a verdade. O policial não tem
bola de cristal para saber quem é o
real culpado", disse o promotor.
A defesa de Santos recorreu da
sentença e o caso foi enviado para
o Tribunal de Justiça. Pedidos de
habeas corpus para suspender a
prisão do ex-tenente foram negados pela Justiça.
No processo, os advogados afirmam que houve "armação dos
meliantes" e que não há provas de
que houve tortura. Os ferimentos
dos jovens poderiam ter ocorrido
nos dias em que ficaram no distrito policial em acerto de contas entre presos, segundo a defesa.
(GILMAR PENTEADO)
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