São Paulo, domingo, 1 de fevereiro de 1998

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Como ficam os salários e a formação dos professores?

Abicalil - Há que se considerar que o salário dos professores está no conjunto da política salarial dos servidores públicos, e há aí muitas barreiras ainda a serem superadas, no sentido que a alteração salarial do magistério não seja um mero recurso de emergência, mas que possa se constituir numa projeção de carreira que realmente valorize e profissionalize o exercício dessa função pública.
Nesse sentido, os instrumentos que o fundo dispõe são instrumentos insuficientes
Eu dava o exemplo aqui do efeito da média. Pela própria projeção dos recursos do fundo, a média seria R$ 409. Quando o governo federal fixa um decreto em R$ 315, já força para baixo. É efetiva a melhora em muitos municípios brasileiros, que saem de R$ 32 para R$ 120. O problema é saber que influência esse patamar de referência nacional terá em centros onde a capacidade financeira é melhor.
A demanda salarial terá de se fazer, sem dúvida nenhuma, nos conselhos gestores de acompanhamento do fundo e na batalha sindical de enfrentamento das diversas reformas que vão vir e, sobretudo, da exigência do cumprimento do princípio do fundo, que é o de valorização do magistério.
A formação continuada do professor exige o exercício da leitura, um exercício que o professor em muitas partes deste país está privado de fazer, não só pela condição de salário, mas pela condição de sobrejornada.
Não posso conceber que o professor trabalhe apenas quatro horas por dia porque ele está na sala de aula quatro horas por dia. O trabalho do professor vai bastante além dessas quatro horas.
Eu também não posso conceber que, em qualquer lugar deste país, R$ 300 seja um salário suficiente para quem tem formação superior, mesmo que seja na cidade mais pobre do Maranhão.
Durham - A questão do salário é uma das mais complicadas de todo o problema educacional, porque ela não pode ser resolvida simplesmente com a idéia de um piso.
Ela tem que estar associada à carreira, tem que estar associada à relação entre o que ganha um iniciante e o que ganha um professor de final de carreira. Também está associada à questão da aposentadoria. São questões que têm que ser vistas no seu conjunto.
Então, eu acho que nós temos que ter uma política de incremento permanente e gradual dos salários dos professores, condicionada a uma racionalização da carreira, a uma ampliação de uma jornada que seja única, uma diferença razoável entre o piso e o teto.
Malta Campos - Eu gostaria de falar sobre os efeitos das décadas de desvalorização do professor e da professora -a maioria é mulher.
O que aconteceu historicamente? Desvalorizados no salário, desvalorizados no status, o próprio recrutamento desses professores passou a ser entre aquelas pessoas que tiveram acesso aos cursos de pior qualidade.
No Estado de São Paulo, inúmeros professores são formados em outros Estados, enquanto os professores formados no Estado de São Paulo vão fazer outra coisa.
Muitos benefícios foram dados nas negociações com o sindicato em troca de uma compensação pelo salário baixo -falta abonada, férias assim ou assado, licença saúde mais fácil, aposentadoria num prazo menor.
Outra coisa: a própria satisfação no trabalho. No momento em que você tem uma escola que não tem condições mínimas de ter um trabalho em equipe, de fixar o professor naquela escola, de ele encontrar satisfação no seu trabalho, você vai tendo o uso cada vez maior desse subterfúgio de querer fugir da sala de aula de qualquer jeito.
Essas questões todas estão interligadas. Se você quer investir em formação, você tem que ter uma reserva técnica no dinheiro que você está destinando ao salário dos professores. Por quê? Porque você vai ter que deslocar esses professores para a semana de formação, para cursos de complementação para discussões em equipe sobre o trabalho que é feito na escola.
Mares Guia - Os professores são o maior contingente de funcionários públicos. No caso de Minas Gerais são 66% de todos os trabalhadores ativos do governo.
Conseguimos em sete anos transformar o piso da professora primária de US$ 90 para US$ 280. O professor superior começa com R$ 504 para 18 aulas por semana.
Esse é um bom ou um mau salário para o mercado? Contando a área pública toda, o salário médio é de R$ 518, e mais de 50% do pessoal ganha menos de R$ 580; só 10% ganha mais de R$ 1,2 mil.
Esse é o mercado da terceira capital do Brasil. É possível pagar mais? Em Minas, não é. A menos que acabemos com a repetência.



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