São Paulo, domingo, 01 de outubro de 2000

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Comércio informal movimenta a economia

DA REPORTAGEM LOCAL

A economia rudimentar de Paraisópolis (zona sul de São Paulo), baseada no pequeno varejo, não tem regras. Raros são os que sabem ali quem é Pedro Malan, o ministro da Fazenda. Armínio Fraga, presidente do Banco Central, simplesmente não existe (tal como o banco).
É uma economia sem nota fiscal que nasceu e floresce no cômodo da frente das casas e prospera à revelia de qualquer manual de administração. Tem fiado, mas nada de juros.
Quem pode abre o que quiser, independentemente da existência de outros concorrentes no pedaço. A renda familiar dos mais abonados é de R$ 500. "Abaixo disso tem de tudo, e a média não passa de R$ 150", diz José Rolim, o homem que tem todos os números da favela na cabeça e nas gavetas de seu pequeno escritório de presidente da União dos Moradores.
Paraisópolis tem 20 padarias, dezenas de "portas" que vendem material de construção, seis farmácias, oito locadoras de vídeo, um supermercado, dez minimercados, uma floricultura e assistência técnica para eletrodomésticos, além de quiosques de guloseimas, lojinhas de roupas e uma emissora de rádio FM, a Rádio Paraíso.
Os hábitos de consumo favorecem a indústria eletroeletrônica: 60% têm televisão; 40% das casas têm geladeira e 30%, carro (geralmente Brasília e Passat antigos).
O setor imobiliário tem participação importante na economia local, geralmente em transações entre os moradores. Quem melhora de vida melhora de casa e até junta dinheiro para comprar algo como o sobradão de alvenaria com reboco (detalhe importante) na "área nobre", à venda por R$ 25 mil -a negociar.
Quando trocam um barraco de um cômodo e cozinha, com aluguel de R$ 100, por uma casa de alvenaria com sala, quarto, cozinha e banheiro, por R$ 200 a R$ 250 ao mês, festejam com aguardente Ypioca, o champanhe da região. Quando saem do grotão (periferia da favela), somam o churrasquinho no espeto à Ypioca.
Não faltam bares para comemorar em Paraisópolis. "O que tem mais aqui é bar e menino", diz José Rolim. São 200 bares e 20 mil habitantes de zero a 18 anos.
Há, desde a última semana, a casa lotérica "Tô rico". Mas ela não despertou o sonho de mudar para o outro lado da avenida. "Daqui só saio para o cemitério", diz Luiz Soares da Costa, o Luiz Caboclo, que vive do aluguel de R$ 100 por cada uma das 20 casas que construiu na área nos últimos 42 anos.
Caboclo é visto como mestre-sala pela idade, generosidade e, de certa forma, como o "Pedro Álvares Cabral" descobridor da favela, em 3 de janeiro de 1957. Voltar para Pernambuco? "Nem pensar", diz. "Lá, uma onça pintada quase comeu minha orelha."
Também não sai de lá a estudante de pedagogia Maria Betânia Guerreira Mendonça, 42, funcionária do Ceagesp e fundadora da União dos Moradores, em 1985.
"Adoro aquilo", diz Betânia, cujo nome foi tirado de uma das canções de Nelson Gonçalves, o ídolo de seu pai. "Morro de medo da violência da cidade, mas quando chego em Paraisópolis, mais de meia-noite, a pé, respiro aliviada", afirma.


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