São Paulo, domingo, 01 de outubro de 2000

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SAÚDE

Descuido dos pais contribui para obesidade do filho

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Um alerta para pais desregrados ou desleixados com a gula dos filhos: quase dois terços das crianças "fofinhas" de hoje serão os obesos de amanhã. O agravante é que esse exército de novos gordinhos vem crescendo mais rapidamente entre as populações que nos últimos anos passaram a ter maior acesso à comida. E com velocidade ainda maior nos grupos menos informados.
A boa notícia do recuo da desnutrição está sendo ameaçada pelo risco de uma epidemia de obesidade. Entre crianças de até 5 anos de todo o país, o índice de excesso de peso se manteve em cerca de 5% entre 1989 e 1996.
Mas enquanto no Sudeste os gordinhos caíram de 7,5% para 5,8%, no Nordeste eles passaram de 2,5% para 4,5%. "Nosso grande medo é que o processo de modernização leve a uma epidemia de obesos", diz José Augusto Taddei, professor de nutrição e metabolismo do departamento de nutrição da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
O risco da obesidade é um dos temas tratados no concurso de livre-docência que Taddei presta esta semana na Unifesp. Entre os números que compilou, alguns são reveladores: o consumo de refrigerantes per capita, por ano, passou de 7 litros em 1975 para 16,2, em 1987, e 22,4 em 1996.
O consumo de refrigerante, que triplicou nesses 20 anos, é apenas um indicador de direção. Outro, que vai em sentido oposto, é a educação: a obesidade em crianças da região Sul, filhas de mães com quatro ou mais anos de escolaridade, vem caindo duas vezes mais rapidamente.
Um amplo levantamento da Unifesp feito em oito escolas públicas da região de Vila Mariana encontra um índice de 10,6% de obesidade entre crianças de 7 a 10 anos de idade. São crianças que estão com peso 20% a 30% superior ao considerado normal.
Para baixar esses índices, os especialistas apontam a informação e o exemplo dos pais como a melhor saída. Domingos Palma, presidente do departamento de nutrição da Sociedade de Pediatria de São Paulo, chama a atenção para "tratamentos equivocados" impostos a crianças e adolescentes ou adotados por eles. "Não se pode fazer uma dieta restritiva numa fase de crescimento", diz.
Remédios, nem pensar. Já pequenas atitudes, como retirar a gordura da carne e eliminar a pele do frango, custam pouco e ajudam muito, diz o médico.
Incluir uma atividade esportiva que tire a criança ou o jovem da frente da televisão e do videogame é essencial. E manter horários para as refeições é fundamental.
A preocupação com a obesidade é tanta que o tema está no centro dos debates sobre nutrição do Congresso Brasileiro de Pediatria, que acontece na próxima semana, em Fortaleza. É no Nordeste, justamente, onde a mudança do padrão alimentar do brasileiro vem causando mais inquietação.
Fábio Ancona Lopez, professor titular de nutrição do departamento de pediatria da Unifesp e presidente em exercício da Sociedade de Pediatria de São Paulo, concorda que a obesidade é uma ameaça, mas acredita que nossos jovens não seguirão o mau exemplo americano. "Felizmente, o fast-food não fez tanto sucesso entre nós." Segundo ele, alguns estudos regionais mostram que o brasileiro também adora o trio "hambúrguer, batata frita e sorvete", mas não abandonou seu padrão "arroz, feijão, bife e salada".
Outro lado da má alimentação que será tratado no congresso de Fortaleza são os distúrbios provocados por um "vínculo fraco" entre mãe e filho. Domingos Palma, que também faz parte do Núcleo de Nutrição Infantil do Estado de São Paulo, diz que vem crescendo os casos de desnutrição grave por "causa da relação muito ruim da família com a criança". "Muitas vezes a mãe, que também não recebeu atenção, nem percebe que está tratando o filho de maneira distante." Os efeitos desse "vínculo fraco" podem resultar também em obesidade, e costumam não escolher nível econômico -embora afetem mais os grupos menos escolarizados.


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