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Segundo João Carlos da Rocha Mattos, um dos investigados, conduta da polícia não tem amparo legal
Para juiz, diretor da PF é "irresponsável"
FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL
O juiz federal João Carlos da Rocha Mattos afirma que o diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Lacerda, foi "irresponsável" e
"omisso", ao permitir que juízes
federais fossem seguidos, fotografados e investigados sem autorização do Tribunal Regional Federal. Sobre as gravações com trechos de conversas suas, diz que
"não há nada que possa ser interpretado como indício de crime".
Ele concedeu entrevista, ontem
à tarde, em seu gabinete.
Folha - Qual é a sua avaliação da
Operação Anaconda?
João Carlos da Rocha Mattos - Tive acesso a cópias de cinco procedimentos. Não existiria, no sentido técnico, até o momento, denúncia formal contra qualquer
das pessoas, ação penal. Os simples procedimentos só foram remetidos para o Tribunal Regional
Federal nos dias 20 e 21 de outubro, e, há poucos dias, desmembrados em cinco procedimentos.
Folha - O que isso significa?
Rocha Mattos - Que [as investigações] estavam, na verdade, sendo conduzidas de forma absolutamente ilegal pelo Serviço de Inteligência da Polícia Federal. Há trechos de conversas, uma delas com
o César Herman [agente da PF
César Herman Rodriguez], é meu
amigo pessoal, há mais de 10 anos.
Folha - Qual é o trecho da conversa que seria mais comprometedor?
Rocha Mattos - Eu pergunto se
ele pode me emprestar um dinheiro. Eu disse que declararia ao
Imposto de Renda. Eu não sei se
ele declarou, deve ter declarado.
Folha - E o diálogo com o delegado Augusto Bellini, quando o sr. teria perguntando se o "Serginho"
[empresário Sérgio Chiamarelli Júnior] tinha "gostado da sentença"?
Rocha Mattos - Deve ter havido,
sim. O dr. Bellini é meu colega de
academia e amigo do Sérgio há
mais de 20 anos. Um dia ele me falou: "Sérgio tem processo com
você, mas não tem culpa". Isso é
comum falar. Quando dei a sentença absolutória, falei para ele:
"Olha, aquele seu amigo lá, eu absolvi, junto com outros". Aí ele
diz: "Ah, o Serginho já está sabendo, o advogado falou para ele".
Folha - E sobre o episódio em que
se alega empréstimo de armas
apreendidas para o César?
Rocha Mattos - Pode ter havido
sim... Eu acho que houve, sim.
Folha - Isso é peculato [apropriação de bem público]?
Rocha Mattos - Não. Em épocas
de muitas brigas, minha e da Norma (ex-mulher), consta que a
Norma pediu para o César ir em
casa e retirar armas que estavam
lá. Era uma arma que eu tinha formalmente, com carga [registro
oficial], e essa arma foi retirada.
Folha - O sr. alguma vez recebeu
benefício por sentença proferida?
Rocha Mattos - Nego formalmente. Aliás, houve comentário
sobre um aparelho de televisão...
Folha - Onde o sr. comprou?
Rocha Mattos - Comprei de uma
pessoa, numa loja. Mandei providenciar a segunda via da nota.
Folha - O sr. teve algum outro
bem apreendido?
Rocha Mattos - Não. Eu não opero computador. Levaram o computador escolar do meu filho.
Folha - O que mais o incomodou?
Rocha Mattos - Estou revoltadíssimo. Porque se grampeia, se interpreta sem coisas concretas, e
depois se pede busca e apreensão
para tentar obter a prova...
Folha - O sr. teria serenidade para
continuar julgando?
Rocha Mattos - Não sei que decisão vou tomar. Não vou despachar nada. Estou ainda digerindo.
Hoje, não assinei nenhum ofício.
Folha - Mas qual é a sua avaliação
geral sobre a operação?
Rocha Mattos - O dr. Paulo Lacerda [diretor da PF] está conduzindo a Polícia Federal de maneira incompetente, de maneira
omissa, de maneira irresponsável.
Porque o Serviço de Inteligência é
diretamente subordinado a ele. E
ele sabia que havia uma operação,
ele sabia que juízes federais passaram a ser investigados pela Polícia
Federal e pelo Ministério Público
sem ordem do Tribunal Regional
Federal.
Folha - Não havia uma autorização judicial em Alagoas?
Rocha Mattos - O juiz de Maceió
era de primeira instância. A autorização era para "grampos" de delegados e pessoas sem foro especial. Esse relatório é ridículo. O dr.
Paulo Lacerda é incompetente,
omisso, irresponsável...
Folha - Quem vai lhe defender?
Rocha Mattos - Eu não sei se vou
constituir advogado. Não tem denúncia, ao que parece... Talvez eu
me defenda pessoalmente.
Folha - Qual é sua relação com os
juízes Casem e Ali Mazloum?
Rocha Mattos - Formal. Saímos
para tomar um cafezinho.
Folha - O sr. fazia operações com
o Toninho Barcelona [doleiro]?
Rocha Mattos - Nunca.
Folha - O sr. atribui a operação a
alguma reação pelas representações contra desembargadores?
Rocha Mattos - Vou fazer justiça.
O pessoal do dr. Scartezzini [Jorge
Scartezzini, ex-presidente do TRF
e ministro do STJ] não tem nada a
ver com isso. Nada. Até imaginei
que pudesse ter alguma coisa.
Folha - O sr. conhecia algum
agente da operação?
Rocha Mattos - Não.
Folha - Como o sr. foi tratado?
Rocha Mattos - Eu fui tratado
muito bem. Mas, antes de eu chegar, a Norma e o Caio [filho do
juiz] foram maltratados, com metralhadora virada para um menino de doze anos...
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