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SAÚDE
Indigentes não são alcançados por campanhas; 15% dos 30 mil moradores de rua podem estar com HIV
Aids avança entre moradores de rua
AURELIANO BIANCARELLI
da Reportagem Local
Cerca de 30 mil indigentes sem
casa nem família, perambulam
pelas ruas de São Paulo. Estima-se
que 15% dessa população estejam
com HIV ou Aids. É uma porcentagem tão alta quanto a de certos
presídios, como a Casa de Detenção.
Na data em que em acontece o
Dia Mundial de Luta contra Aids,
os moradores de rua estão entre
os grupos que mais preocupam,
porque os números da doença
não têm diminuído entre eles. O
motivo é que não seriam alcançados por programas e campanhas.
Embora sejam apenas estimativas de ONGs (Organizações Não-Governamentais), os números de
contaminados revelam o cenário
da Aids mais miserável e fora de
controle.
Dormindo embaixo de pontes e
viadutos, grande parte dessa população de rua mais bebe do que
come. Entre eles, a promiscuidade e a violência sexual são práticas
cotidianas.
Eles estão fora dos serviços de
saúde e quando caem doentes
não conseguem tomar a medicação prescrita. Para quem vive sob
a ameaça de morrer esfaqueado
pelo desconhecido ao lado, o risco
da Aids fica minimizado.
"Ninguém está dando atenção
para essas pessoas", diz o padre
Naveen Maniakompel, coordenador da ONG Fraternidade Povo
da Rua. A estimativa da alta porcentagem de infectados é feita pelo padre e sua equipe. Todas as
noites de quinta-feira, cerca de 20
voluntários dessa ONG percorrem viadutos e as marquises da
região central, onde essas pessoas
se juntam para dormir. Na sede
do programa, há cerca de 600
doentes de Aids cadastrados.
"Mas não adianta levar remédio
e comida", diz o padre. "Essas
pessoas precisam de moradia.
Sem um lugar para viver, sem emprego nem refeições mínimas,
não há como seguir um tratamento que exige mais de 20 comprimidos por dia."
Para Caio Rosenthal, infectologista do Emílio Ribas, esses doentes "são terminais sociais, sem nenhuma perspectiva de vida".
Deixá-los de lado de programas
de assistência médica e social pode representar o perigo de haver
aumento de vírus resistente nessa
população.
Muitos dos infectados pelo HIV
também são portadores do bacilo
da tuberculose. Ao se recontaminarem uns aos outros, os pacientes formam cepas de vírus ainda
mais resistentes.
"São esses doentes que hoje
ocupam com mais frequência os
leitos dos hospitais", diz Rosenthal. "Assim que melhoram, pegam seu saquinho de medicamentos e desaparecem. O pacote
de remédios, que chega a custar
US$ 1.000, é abandonado na primeira esquina." Como não têm
endereço nem documentos, os
serviços sociais dos hospitais não
conseguem rastreá-los.
"Estamos vivendo um desafio
enorme, tentando informar essa
população e chamar a atenção do
governo e da sociedade", diz o padre Maniakompel. Ao longo do
dia de hoje, na estação Brás do
metrô, a ONG espera reunir cerca
de 2.000 moradores de rua, oferecendo comida e informações mínimas.
Um dos esforços da Fraternidade Povo da Rua é fazer com que os
pacientes sigam minimamente os
tratamentos, uma missão poucas
vezes possível.
O que mais pesaria nesse caso,
seria a situação de total abandono, mais do que a miséria.
Uma pesquisa feita este ano pelo Programa Estadual de DST-Aids, de São Paulo, mostrou que
70% das pessoas que recebiam o
coquetel anti-Aids vinham tomando os remédios corretamente. Um nível de aderência melhor
mesmo que os registrados na Europa.
A médica Maria Ines Nemes, da
Faculdade de Medicina da USP e
coordenadora da pesquisa, disse
que a adesão era menor nos grupos com menor escolaridade e
sem renda alguma. "Mas o fator
que mais alterava os níveis de
aderência era a qualidade dos serviços de saúde", diz a médica. O
que significa que um bom trabalho da rede pública poderia atingir também os moradores de rua.
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