São Paulo, Quarta-feira, 01 de Dezembro de 1999


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DEPOIMENTO
"Se te ameaçarem, você puxa a faca e grita que tem Aids"
Doença vira forma de defesa contra a violência das ruas

da Reportagem Local

O violento universo da rua ainda é pouco conhecido dos organismos voltados para Aids e saúde. Relatos de ex-moradores mostram que o risco da doença fica pequeno diante das ameaças do cotidiano. Muitas vezes, o fato de ser portador vira uma forma de defesa.
"Você dorme sempre com uma faca ou um pedaço de garrafa ao alcance da mão. Se te ameaçarem, você puxa a faca e grita que tem Aids."
O relato é do ex-auxiliar de enfermagem Jean R., 37, que abandonou a casa de uma irmã e perambulou sete anos pelas ruas depois que descobriu que tinha Aids. Há quase um ano ele está numa casa de abrigo.
"Depois de um tempo (na rua) você não consegue mais sair, vai ficando tão fraco, o cabelo e a barba compridos, que foge das pessoas como um bicho. Se não vier alguém de fora te ajudar, você não sai mais."
A violência sexual é frequente. "A maioria das pessoas que conheci na rua era homossexual, como eu. Mendigos de fora ficavam marcando a gente. Um dizia que conhecia uma marquise boa e acabava levando alguém. De noite, no escuro, bêbados, a violência sexual era uma coisa muito comum."
Como outros doentes de Aids, Jean costumava levar no bolso um papel de algum hospital dizendo que estava com a doença. "Era uma forma de proteção e de conseguir ajuda. Em cidadezinhas do interior, quando viam aquilo, ficavam tão assustados que logo ofereciam alguma coisa. O serviço social dava um passe de ônibus e mandava a gente para outra cidade. É como acontecia nos hospitais de São Paulo. As assistentes sociais diziam que tinha uma vaga em tal abrigo, você chegava lá e nada. Então voltava para a rua."



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