São Paulo, quinta, 2 de julho de 1998

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OPINIÃO
A hora de São Paulo

WALTER FELDMAN

Há um viés distorcido no incipiente debate travado no momento sobre a decadência paulistana. Por vários motivos, a começar pelo maior deles: Discutem-se somente as consequências sem tocar nas suas profundas causas. Alguns sintomas desse depauperamento econômico estão visíveis aos olhos dos mais atentos observadores há bastante tempo.
Ao que se sabe, a Paulicéia já há alguns anos parou de crescer. Sim, é isso mesmo: São Paulo está enfrentando o fenômeno da reversão populacional. Por outro lado, deixou de ser o maior parque industrial do Estado. Desde 1997, a vizinha Campinas possui o mesmo tamanho da fabril Paulicéia.
É um fenômeno que não pode ser chamado de cataclismo, porque é algo que ocorreu em outras grandes capitais do mundo, como Nova York e Paris, que também deixaram de ser centros industriais para se tornar cidades de serviços. Isso deve ocorrer com São Paulo, caso as autoridades municipais reajam ao atual imobilismo.
O grande erro na discussão sobre a crise paulistana é o de não incluir a Grande São Paulo nos debates, ou seja, não tratar da região metropolitana da Paulicéia, que engloba dezenas de municípios.
Ora, as regiões metropolitanas são aprovadas por leis estaduais para que recebam um tratamento sincronizado e integrado dentro das decisões administrativas. Caberia ao prefeito de São Paulo, por ser o líder do município mais rico do país, a iniciativa política de coordenar uma ampla ação que beneficiasse toda a região.
Em minhas andanças pela região metropolitana, percebo a falta de interface de municípios como Taboão da Serra, Itapevi, Mauá e a capital. São cidades vizinhas que, na maioria das vezes, vivem da economia da Paulicéia. Seus moradores quase sempre trabalham em São Paulo e só voltam para dormir em suas cidades -conhecidas como cidades-dormitórios.
Com vontade política do prefeito paulistano, cujo cargo e volume de recursos possibilita um diálogo com todas as autoridades federais e estaduais, algo poderia ser feito em benefício desses milhares de habitantes da Grande São Paulo.
Acredito que o momento de uma grande mudança de hábitos em São Paulo seja agora, no momento em que a cidade experimenta uma reviravolta em seu modelo econômico, em que deixa de ser um centro industrial para se transformar num centro de serviços. É preciso notar que essa é uma tendência irreversível, anotada pelos números: dos US$ 35 bilhões de novos investimentos captados pelo governo de Mário Covas, apenas US$ 2 bilhões foram mandados para a capital. Todo o restante teve como destino o interior do Estado. Parte desse dinheiro se encontra investido em alguns municípios da Grande São Paulo.
Pela primeira vez, o Estado enfrenta um desenvolvimento em toda a sua extensão. Deixou de ser aquele crescimento regional, privilegiando algumas poucas cidades. Aliás, os jornais têm deixado de noticiar aspectos importantes dessa tendência. Se a capital, nos últimos anos, perdeu cerca de 98.585 empregos, no mesmo período, o interior abriu cerca de 79.491 novas vagas (dados do IBGE e do PNAD).
Por outro lado, se os jornais noticiam os cortes de empregos nas indústrias -muitas delas fechando e tomando o rumo do interior-, a capital experimenta um déficit de mão-de-obra em vários setores, a começar pela informática, setor em que especialistas detectam quase 100 mil vagas. Em entrevista à revista "Carta Capital", o empresário Emílio Odebrecht dizia que, ao inaugurar o hotel Renaissance, teve de contratar pessoas nos outros hotéis da cidade. Não encontrou no mercado pessoas capacitadas.
É importante que exista uma ação planejada a partir da maior prefeitura brasileira, com os olhos voltados para o imenso potencial humano que não vem merecendo atenção de seus atos administrativos e políticos. O momento de São Paulo mostrar liderança é agora.


Walter Feldman, 44, médico, é deputado estadual pelo PSDB-SP. Foi secretário da Casa Civil do Estado de São Paulo



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