São Paulo, sábado, 02 de setembro de 2006

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WALTER CENEVIVA

Propaganda versus meio ambiente


A poluição da propaganda, em particular nas ruas mais movimentadas, atinge a intoxicação visual


NOS ÚLTIMOS dias, a campanha eleitoral registrou muitas referências ao meio ambiente. Vieram dos que se queixam de demora dos laudos ambientais. Dos que reclamam leis mais severas para preservar as condições da vida. A expressão "meio ambiente" sempre me pareceu errada ou, pelo menos, imprópria. Deveria excluir o segundo termo (ambiente) para privilegiar o primeiro (meio) ou vice-versa. O legislador poderia, ter adequado "environment", usando só ambiente. Com meio ambiente, usou duas palavras para definição única.
A questão semântica não interfere com o fato jurídico. A Constituição atribui (art. 225) a todos o direito individual ou coletivo ao meio ambiente. Sua preservação seria dever do Estado. Há, porém, órgãos oficiais com o vício da não-preservação seja por se omitirem, seja por permitirem a corrupção ou o abuso. Neste período pré-eleitoral, muros, postes e ruas agravam as condições com cartazes e pichações. Exemplo corriqueiro também colhe quem percorre estradas brasileiras. Basta que o governante comece a tapar buracos para surgirem placas anunciando a "recuperação". O descuido com as condições ambientais, ao indicar o responsável pelo "benefício", perturba a visibilidade do entorno, ou seja, do ambiente protegido, além de confundir os motoristas.
Tem sido sempre assim, desde que o meio ambiente começou a ser preocupação científica, nos começos do século 20. Os últimos anos agravaram a condição urbana. Em nossas maiores cidades, a poluição da propaganda, em particular nas ruas mais movimentadas, está atingindo a intoxicação visual. Com os anúncios gerados eletronicamente, das figuras e pessoas em movimento, acrescenta-se, à poluição, o maior perigo para o trânsito.
Se, na linguagem constitucional, o ambiente é de todos, uma das formas de o garantir consiste em implementar o afastamento dos poluidores. A benefício próprio, eles ocupam prédios, terrenos e espaços com propaganda que, à noite, acrescenta a perturbação do sono de quem vive por perto. O Código Civil dá, aos vizinhos, a proteção do sossego e o da saúde das pessoas. A proibição das interferências prejudiciais é desrespeitada, até pelas luzes e cores de centenas de anúncios acendendo e apagando.
O direito da publicidade é legítimo e conveniente. Seu abuso, porém, tem quebrado o equilíbrio ambiental. A infração seria apenas dos abusadores se o poder público fizesse sua parte, impondo as restrições previstas em lei, direta ou indiretamente. Acontece que os interesses dos anunciantes e da indústria publicitária, da criação à instalação, têm muito poder para impedir a limpeza, único meio para garantir a qualidade do ambiente.
Desse ponto de vista, aliás, a posição do prefeito de São Paulo, confirmada na última semana, tende a acabar com o excesso dos outdoors (eis o inglês acolhido sem cerimônia). Tem atribuição legal para tanto, já que em cada cidade a municipalidade é a responsável pela regulamentação de interesse local. Os munícipes devem cobrar dos prefeitos e vereadores a preservação do equilíbrio entre os direitos à propaganda e ao ambiente humano preservado. Na dúvida, deverá preferir o segundo, pois se trata de garantia constitucional atribuída a todos. Todos, no artigo 225, não contempla exceções.


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