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São Paulo, domingo, 02 de novembro de 2003

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URBANISMO

Jardins públicos vão ter vegetação com árvores altas e plantas até 80 cm para evitar a formação de esconderijos

São Paulo adota paisagismo antiviolência

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

As azaléias, coitadas, pagaram o pato. A flor-símbolo de São Paulo foi deixada de lado em parques, praças e avenidas de São Paulo desde que Marta Suplicy (PT) assumiu a prefeitura, há três anos. Há pelos menos duas razões para o sumiço: sua manutenção é dispendiosa e, sinal dos tempos, as moitas que o arbusto forma tornaram-se um perigo a mais para os dias violentos que correm.
Na reforma que a prefeitura fará em três das principais praças do centro da cidade (Sé, República e Arouche) aparece com clareza as novas ordens para o paisagismo público. Em todas elas haverá só árvores altas e plantas que não ultrapassem 80 cm de altura, segundo Sérgio Marin, 47, superintendente de paisagismo e meio ambiente da Emurb (Empresa Municipal de Urbanismo). Moitas acima dessa altura serão removidas.
"Azaléia é linda, mas vira esconderijo e exige muita manutenção. Prefiro plantas mais rústicas", afirma Marin. Segundo ele, o trabalho de paisagismo da Emurb privilegia o aumento da biodiversidade e a criação de uma identidade ambiental para a cidade, mas seria "irresponsabilidade" ignorar a escalada do medo pela qual passa São Paulo.
A mudança nos jardins públicos impulsionada pela violência não é um fenômeno exclusivamente paulistano. A Prefeitura do Rio de Janeiro adota uma política idêntica. No parque mais famoso do Rio, o do Flamengo, projetado por Burle Marx, câmeras de vídeo vão cuidar da segurança já que as moitas não podem ser removidas porque os jardins são tombados pelo patrimônio histórico.
Há um conceito comum nas três praças que serão restauradas, todas dentro do projeto de revitalização do centro, financiado pelo BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento). O objetivo é deixá-las transparente ao olhar, sem obstáculos no caminho.
O caso mais extremo talvez seja o da praça da Sé. O miolo da praça virou uma zona de exclusão, uma área onde ninguém se arrisca a frequentar por causa do risco de assalto. Na reforma, a primeira providência será remover as floreiras com mais de 1,5 metro de altura que se tornaram esconderijo de meninos que vivem nas ruas.
"A praça da Sé vai virar uma praça plana, sem plantas funcionando como barreira, para aumentar a segurança", diz Sérgio Torrecillas, 40, subprefeito da Sé. Sem a reforma, diz ele, a Sé continuará sendo só uma praça de passagem e não conseguirá cumprir um dos planos da prefeitura de revitalização do centro. O centro com as praças vazias seria como uma boca banguela, compara.
A avaliação de Torrecillas é que sem segurança a reocupação seria uma missão impossível. Tanto que a prefeitura criou oito bases 24 horas da Guarda Civil Metropolitana na região central e está mudando a iluminação e rebaixando os postes para aumentar a claridade nos espaços públicos.

Bairros nobres
Não é só na área central que a violência funciona como braço auxiliar no redesenho de praças e jardins. Na região da Berrini (zona sul) e no Alto de Pinheiros (zona oeste), dois dos espaços imobiliários mais valorizados de São Paulo, paisagistas tiveram que banir arbustos por causa de segurança e outros inconvenientes.
Marcelo Faisal, 41, foi contratado pelos supermercados Pão de Açúcar para recriar o jardim da praça Panamericana, e a primeira tarefa que enfrentou nada tinha de paisagística -havia um grupo de cinco moradores de rua vivendo debaixo das azaléias do canteiro central. "Só saíram com ajuda da polícia", conta Faisal.
O paisagista manteve as azaléias, mas submete-as a podas constantes. Mesmo assim, vire-e-mexe, aparecem moradores sob as moitas. Para evitar a ocupação, o paisagista recorreu a agaves (espécie que dá uma folha similar a uma espada, tal qual o sisal) para formar uma barreira.
Pior, na avaliação de Faisal, é que as azaléias transformam-se em banheiros públicos: "Azaléia, sem manutenção constante, vira uma espécie de favela vegetal ou banheiro. A prefeitura faz bem em reduzir o uso de arbustos, mas precisa construir banheiros nas praças e parques".
Isabel Duprat, 48, que criou os jardins nos canteiros da avenida Chucri Zaidan só com árvores e plantas baixas, concorda que arbusto é inconveniente porque exige cuidados. Mas acredita que a política da prefeitura serve para mascarar a falta de manutenção nos jardins públicos. "As áreas verdes estão abandonadas. Não adianta plantar árvores se não tiver manutenção."
Marin, da Emurb, concorda que a manutenção é difícil quando se pensa na escala de São Paulo. Só na atual gestão, diz, 11 mil árvores foram plantadas e cerca de 900 mil metros quadrados, o correspondente a 90 campos de futebol, foram ou estão sendo ajardinados. No próximo ano, segundo ele, quando as subprefeituras estiverem estruturadas, a manutenção dará um "salto de qualidade".



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