São Paulo, segunda-feira, 04 de abril de 2005

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MASSACRE NA BAIXADA

Polícia do Rio mata mais do que a dos EUA

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

A Polícia do Rio matou mais pessoas em confrontos do que todas as 21 mil corporações que atuam nos Estados Unidos, segundo o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania.
Em 2004, 983 pessoas morrem no Estado do Rio sob o fogo de policiais. Em 2003, o número foi ainda maior -1.195. Em 2002, os mortos somaram 900. Nos EUA, a média de mortes foi de 341 por ano no período de 1998 a 2002.
"Os números são excessivamente elevados e tiveram um crescimento assustador nos últimos anos. Mostram que a polícia do Rio tem licença para matar", diz Leonarda Musumeci, pesquisadora do centro, que é ligado à Universidade Cândido Mendes.
Em 1999, 289 pessoas morreram em confronto -foi a menor marca entre 1997 e 2004. Houve crescimento de 240% de 1999 a 2004.
Os dados foram coletados na Secretaria de Segurança Pública do Estado. Os próprios policiais é que informam que as mortes foram resultado de confrontos.
Musumeci diz que, em alguns casos, os laudos do Instituto Médico Legal revelam que as vítimas foram atingidas de costas ou à queima-roupa, o que indica supostas execuções sumárias.
Ela pondera, no entanto, que houve aumento nas ações de violência do tráfico, o que também resultou num grande número de mortes de policiais em confronto. Foram 50 em 2004 e 48 em 2003. "Mas a maioria dos policias morre fora de serviço, em folga ou por vingança [de criminosos] ou prestando serviços de segurança."
Tal situação, porém, não justifica as mortes: "A polícia tem de agir dentro da lei. Só pode atirar em sua defesa. E não é o que indicam muitos laudos do IML", diz.
O crescimento dos mortos em confronto, diz, sintetiza o modo da polícia de atuar. "O comando é para partir para o confronto e não investir em ações de inteligência."
Para a pesquisadora, a chacina na Baixada Fluminense é reflexo do modelo "equivocado" de segurança pública adotado no Estado.
A polícia do Rio é treinada para agir de modo violento, e o Estado não investe no controle externo nem em inteligência, analisa. "É violência assumida. É uma polícia que tem licença para matar."
Sobre a chacina, ela diz que ainda é prematuro fazer avaliação conclusiva. Afirma, porém, que, se a participação da polícia se confirmar, é "um retrocesso". "O que assusta é o retorno de algo que se achava estar no passado. Mostra que de Vigário Geral para cá a situação não evoluiu."
Ao analisar a suposta participação de policiais, Musumeci diz que a ação pode ter sido um ato de "terrorismo". "Algo para aterrorizar e mostrar a força."
A pesquisadora diz que para solucionar o problema de segurança pública o Estado tem de "repensar" toda sua atuação na área.
Para começar, diz, é preciso investir em controle externo, reforçar e aparelhar ouvidorias e corregedorias. Também é necessário mudar o modelo de treinamento, focando-o em mais "inteligência e menos brutalidade". Além disso, diz, a melhoria da remuneração e o combate à corrupção devem estar mais presentes na agenda do governo para segurança pública.


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