São Paulo, terça-feira, 05 de março de 2002

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VIOLÊNCIA

Manifestação de moradores contra morte de acusado de assalto pela PM ameaçou visita do príncipe Charles ao Cantagalo

Morro protesta e fecha ruas de Ipanema

Sergio Borges/Agência O Globo
Policiais retiram caixa de papelão com fogo de rua de Ipanema


ROSAYNE MACEDO
FREE-LANCE PARA A FOLHA

O protesto contra a morte de um morador pela Polícia Militar na noite de domingo por pouco não provocou o cancelamento da visita do príncipe Charles, ontem à noite, ao morro do Cantagalo (Copacabana, zona sul).
A visita só foi mantida após o cônsul-geral do Reino Unido, Geoffrey Cowling, ter se reunido ontem de manhã, na favela, com lideranças comunitárias e com o comando do Gpae (Grupamento de Policiamento em Áreas Especiais), responsável pela segurança no complexo Cantagalo-Pavão-Pavãozinho. Cowling considerou que a segurança do príncipe não seria afetada e manteve a visita.
Por volta das 22h de domingo, cerca de 30 pessoas fecharam o trânsito na esquina das ruas Teixeira de Melo e Barão da Torre, em Ipanema (zona sul), num dos acessos ao morro. Atearam fogo a caixas de papelão e jogaram pedras nos carros.
Pouco antes, Vítor Hugo da Silva (idade desconhecida) foi morto próximo ao local, ao tentar fugir de policiais do 23º Batalhão. Com ele, segundo a PM, foram apreendidos um revólver 38 e uma réplica de pistola.

"Pelas costas"
Para o presidente da associação de moradores do complexo, Sebastião Teodoro, o revólver foi "plantado" pelos policiais para incriminar Vítor Hugo, acusado pela PM de praticar assaltos na área.
Segundo Teodoro, supostas testemunhas disseram que não houve troca de tiros e que o rapaz foi baleado pelas costas. "Ele estava com uma arma de brinquedo e acabou levando um tiro na nuca", afirmou Teodoro, que admitiu que Silva poderia estar participando de assaltos na zona sul.
Desde que o Gpae se instalou no complexo, há um ano e cinco meses, não era registrado um homicídio de morador na área.
O grupo da PM, considerado modelo pela Secretaria da Segurança, foi criado após a morte de cinco pessoas no local, numa ação policial em maio de 2000. Na época, moradores protestaram, também interrompendo o trânsito de trechos de Ipanema.

Processo
A associação de moradores anunciou que dará apoio jurídico à família de Vítor Hugo para processar o Estado. O caso foi registrado na 14ª DP, que ouviu os dois PMs que participaram da ação. O batalhão também abriu procedimento administrativo para investigar a atuação da dupla.
O subcomandante do 23º BPM, major Luciano Maia, disse que Vítor Hugo foi preso na semana passada, acusado de roubo de bicicleta. Segundo ele, na noite de domingo, um casal procurou a cabine da PM no bairro para denunciar que um grupo de assaltantes estava atacando motoristas perto do acesso ao Cantagalo.
Na versão do oficial da PM, a patrulha foi recebida a tiros no local e os policiais revidaram. Vítor Hugo foi atingido. Morreu no hospital Miguel Couto.
Para o subcomandante, o protesto foi ordenado por traficantes do Cantagalo. Já o líder comunitário afirma que os manifestantes haviam testemunhado o fato e se revoltaram contra a polícia.
A manifestação terminou com a intervenção do major Antônio Carlos Carballo Blanco, comandante do Gpae. De acordo com ele, havia cerca de 20 policiais do 23º BPM e do Getam (Grupamento Especial Tático-Móvel) no local. Ele pediu que os PMs retirassem seus carros, e os moradores encerraram o protesto.



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