São Paulo, Segunda-feira, 05 de Abril de 1999
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TRÂNSITO
Limite de erro pode estar sendo usado fora da média do Inmetro
Brecha em norma de radar pode prejudicar motorista

FREDERICO VASCONCELOS
da Reportagem Local

Uma brecha nas normas que regulamentam o radar eletrônico pode estar inflando a receita de órgãos de trânsito municipais e estaduais, beneficiando também empresas privadas que operam o sistema e recebem parte das multas.
A suspeita foi levantada a partir de recurso apresentado por um motorista multado em Itatiba (90 km ao norte de São Paulo) por dirigir supostamente a 57 km/h numa avenida em que a velocidade máxima permitida é de 50 km/h.
Certo de que não ultrapassara o limite, ele conseguiu anular a multa ao comprovar que o Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial), órgão federal, permite que os radares operem com erro de até 7 km/h (para mais ou para menos).
O episódio cria um precedente para que outros usuários, multados por supostamente dirigir a uma velocidade até 7 km/h acima da permitida, também recorram.
O fato sugere que a legislação deixou aberta a porta para que, num eventual conluio entre autoridades de trânsito, empresários e fiscais coniventes, a norma legal seja usada para multiplicar as multas com infrações não cometidas.
A hipótese de que essa tolerância dê margem a fraudes foi admitida à Folha por dois especialistas em metrologia, que pediram para não ter seus nomes revelados.

Inmetro contesta
"Quando aferimos os equipamentos, partimos do princípio do erro mínimo, não do máximo", diz Jorge Luiz Hessen, assessor técnico do Inmetro, em Brasília.
Segundo ele, "prevalece o bom senso técnico: os equipamentos são calibrados para erro de mais ou menos três quilômetros". Hessen participou dos estudos que fixaram os erros máximos admitidos nas verificações metrológicas de medidores de velocidade.
A possibilidade de conflito entre a norma e a prática, no uso de radares eletrônicos, já tinha sido prevista em 1997 pelas próprias autoridades. É o que comprova um ofício do chefe da agência do Inmetro no Distrito Federal, Carlos Magno de Souza, ao diretor do Detran-DF, Luiz Rioge Miura.
Em resposta a consulta de Miura, o diretor do Inmetro recomendava que, "para fins práticos, a fim de que sejam evitados conflitos de interpretações", a infração só deveria ser caracterizada para veículos com velocidade superior à soma da velocidade máxima regulamentada mais o erro máximo permitido para o equipamento em serviço. Ou seja, a velocidade registrada na placa somada aos 7 km/h do erro máximo permitido para o radar.
Em 29 de junho de 1998, o Inmetro expediu a Portaria nº 115, aprovando o Regulamento Técnico Metrológico. Foi mantido o erro máximo de 7 km/h. A recomendação informal dada em ofício a Miura, contudo, não foi incorporada como regra. A fixação do limite para aplicação das multas ficou a cargo da autoridade local de trânsito.
Tome-se, por exemplo, o que pode acontecer numa via arterial, a partir do novo Código de Trânsito Brasileiro. O artigo 61 permitiu às prefeituras rebaixar as velocidades máximas. Assim, numa via que teria limite normal de 60 km/h, segundo o código, a autoridade municipal pode reduzir esse limite para 50 km/h. Em tese, o motorista pode ser multado se estiver dirigindo a 44 km/h e se o radar apontar 51 km/h, funcionando com erro de 7 km/h. Tudo dentro da lei.
Se, ainda por hipótese, ele estiver trafegando a 54 km/h -ou seja, numa velocidade inferior ao limite previsto pelo código-, poderá vir a perder a carteira de motorista. Nesse caso, o radar estaria marcando 61 km/h, velocidade superior à máxima em mais de 20%, o que caracterizaria infração gravíssima pelo novo código, sujeitando o motorista a uma multa maior e à suspensão do direito de dirigir.


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