São Paulo, segunda-feira, 05 de julho de 2004

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Educador critica fato de professor corrigir redação

DA REPORTAGEM LOCAL

O professor da rede estadual é parte interessada nos resultados do Saresp e não deveria avaliar seus alunos em um exame que pretende medir o desempenho escolar de forma isenta para corrigir possíveis falhas no sistema educacional, avaliam educadores ouvidos pela Folha.
"No Saresp, o trabalho do professor também está sendo avaliado. Não tem lógica o avaliado se auto-avaliar", afirma a educadora Elvira Souza Lima, consultora internacional de educação.
Roberto Portela, professor de políticas públicas da Faculdade de Educação da USP, concorda: "Esse fato enviesa o resultado e compromete a fidedignidade da pesquisa pela falta de controle". Para ele, ainda que a Secretaria da Educação cruze as notas das provas objetivas e de redação para identificar possíveis fraudes, é difícil a detecção dos problemas porque não há uma relação tão clara entre as duas provas.
"A pessoa pode ter ido bem na leitura e na interpretação de texto e se saído mal na redação. Isso é muito comum", diz Lima. Se a pessoa escreve bem, afirma a educadora, certamente o faz também na leitura e na interpretação de texto. Por isso ela acha preferível que os professores tivessem corrigido as provas objetivas e a Fundação Carlos Chagas, a redação.
Segundo Vera Masagão, da ONG Ação Educativa, uma avaliação feita pelos professores é impensável quando se trata de avaliar um sistema. "A correção [da redação] pressupõe critérios metodológicos claros. É preciso isolar elementos subjetivos. Ao corrigir a prova dos seus alunos, o professor pode ser influenciado pelo conhecimento prévio que já tem deles."
Na avaliação de Lima, além do problema ético, é preciso estar atento ao fato de que muitos professores valorizam mais a intenção do aluno do que o texto escrito propriamente dito. "Intenção não é escrita. Para escrever é preciso saber estruturar um texto e, em um processo de avaliação, não pode haver benevolência."
Para o educador Jason Prado, diretor do Leia Brasil, uma ONG carioca de promoção da leitura, o fato de os professores terem corrigido as provas pode ser uma das razões que explicam o bom desempenho dos alunos. "Os resultados estão na contramão de todos os índices de desempenho escolar que estão sendo medidos no Brasil e no mundo."
Na opinião de Roberto Augusto Torres Leme, da Udemo, a grande falha do Saresp foi a correção ter sido feita na escola. "A Fundação Carlos Chagas é quem deveria ter feito toda a correção." Para ele, tanto os professores quanto os diretores de ensino não têm a isenção necessária para avaliar os seus próprios estudantes.
"A gente tem um sentimento. Costumamos falar erroneamente "minha escola, meu aluno" como se fossem nossas propriedades. É a mesma coisa de fazer avaliação do seu filho. A gente é um pouco coruja e isso pode influenciar sim na avaliação." (CC)


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