São Paulo, domingo, 05 de agosto de 2001

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SAÚDE

Diagnosticar câncer infantil ainda é difícil

RENATA DE GÁSPARI VALDEJÃO
DA REPORTAGEM LOCAL

O Departamento de Pediatria do Hospital do Câncer, em São Paulo, declarou guerra à demora no diagnóstico da doença em crianças. Uma das batalhas é conscientizar pais e médicos sobre a importância de prestar atenção às queixas infantis, pois os sintomas são muito inespecíficos (veja quadro nesta página).
As oncologistas pediátricas Karla Rodrigues, 30, e Beatriz de Camargo, 48, autoras de pesquisa sobre o assunto, detectaram a ocorrência da demora na primeira das três fases do estudo, que analisa dados a partir de 1975.
Também constataram que o espaço de tempo entre o aparecimento do primeiro sintoma e o diagnóstico é maior no Brasil que na Inglaterra, na Suécia e nos Estados Unidos (uma diferença que vai de nove a 22 semanas, dependendo do tipo da doença).
Agora, elas querem determinar com exatidão quais as principais falhas que levam a essa demora, para poder combatê-las. "O que causa o atraso? É o sistema de saúde? É falta de informação dos pais? É medo de fazer o diagnóstico de câncer?", indaga Beatriz.
Por enquanto, uma das conclusões mais significativas é que existe no Brasil uma cultura de não-valorização da dor, ilustrada tanto pelo fenômeno da automedicação quanto pela tendência dos pais e dos médicos de considerar as queixas das crianças como manha. "Não é para sair achando que tudo é câncer, mas é necessário valorizar a queixa", diz Beatriz.
Para exemplificar, a pesquisa compara dados do Brasil e da Suécia, mostrando que os suecos portadores de tumor reclamam mais de dor (veja quadro). "Será que nós sentimos menos dor no Brasil ou não damos valor a ela?", afirma Beatriz.

Diagnóstico
O trabalho começou com uma investigação dos prontuários do hospital de 1975 a 1990. Nesse período, segundo as médicas, a média de atraso no diagnóstico caiu de oito para cinco meses.
Os dados da segunda fase, de 1990 a 2000 (quando os prontuários ficaram mais detalhados), estão sendo tabulados, mas as projeções são de que o número mantenha o declive.
"Na primeira pesquisa, concluímos que a família era o maior motivo de atraso na constatação do problema, por falta de conhecimento", diz Beatriz.
"Isso está mudando e a tendência hoje, com as novas técnicas de tratamento e o maior acesso à informação, é cada vez mais a demora se restringir aos casos em que a doença tem difícil detecção", afirma ela.
Nos anos 70, de 15% a 20% dos doentes eram curados; hoje o índice médio de cura é de 80%. Para as autoras da pesquisa, isso pode ter incentivado as pessoas a procurar o diagnóstico mais cedo.
Na terceira etapa do estudo (junho de 2000 a junho de 2002), os pais das 300 crianças que dão entrada por ano no hospital serão entrevistados pessoalmente, para aumentar o nível de detalhamento da investigação.


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