São Paulo, quarta, 5 de agosto de 1998

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TRANSPLANTES
Ministério da Saúde vai assegurar, com medida provisória, direito de manifestação da família do doador
Governo desiste de doação presumida

VANESSA HAIGH
da Sucursal de Brasília

O Ministério da Saúde quer acabar com a doação presumida de órgãos, aquela em que todo brasileiro é considerado doador a menos que manifeste vontade contrária em documento.
O ministério vai acrescentar, por meio de medida provisória, um parágrafo à Lei de Transplantes assegurando o direito de manifestação da família do paciente que sofreu morte cerebral e poderia doar os órgãos.
"É uma doação presumida mais suave", disse o ministro da Saúde, José Serra.
Originalmente, a lei previa que se a pessoa não manifestasse em vida o desejo de não doar seus órgãos seria automaticamente considerada doadora.
Mas segundo Serra, a consulta à família foi sugerida pelo CFM (Conselho Federal de Medicina) na época da implantação da lei, há um ano e meio, e desde então vem sendo seguida.
"Apenas vai se fazer na lei algo que já está ocorrendo na prática, que é a consulta às famílias para não caber nenhuma dúvida a respeito", disse Serra.

Confusão

O texto da MP, que deve ser editada em uma semana, ainda não detalha o que acontece se a família do possível doador não for encontrada. Em meio à uma entrevista conturbada, o secretário de Assistência à Saúde, Renilson Rehem, confundiu-se e chegou a afirmar que, se a pessoa não tivesse manifestado em vida o desejo de ser doadora, os órgãos não poderiam ser retirados, o que representaria um recuo em relação à lei.
Depois da entrevista, o ministério comunicou que sua posição oficial é a de respeitar a vontade manifestada pelo paciente em vida, que pode registrar na carteira de identidade ou de habilitação o desejo de ser ou não doador de órgãos.
Seguindo a prática que vem sendo adotada, espera-se que os médicos comuniquem à família que os órgãos serão retirados. Caso não haja nenhuma manifestação registrada, a família é consultada e a sua vontade será acatada. Se ela se abstiver, o paciente será considerado doador.
A mudança na lei foi sugerida depois que foi constatada a diminuição da oferta de órgãos depois da implantação da Lei de Transplantes. "A lei até agora teve um baixo efeito na oferta de órgãos", disse Serra.
Lista única
A portaria com o regulamento técnico sobre o funcionamento do Sistema Nacional de Transplantes foi assinada ontem. Segundo Rehem, a previsão é que até o final do ano o país já terá conseguido organizar a lista única de pacientes aguardando órgãos. Há 12 centrais estaduais implantadas e quatro em fase de implantação.
Os candidatos a receptores deverão se inscrever nas Centrais de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos, que serão criadas pelas secretarias estaduais da Saúde.
Só poderão criar listas os Estados que possuírem hospitais e equipes técnicas autorizadas a realizar transplantes. Os candidatos a transplante que vivem em Estados que não realizam transplantes deverão se inscrever no Estados mais próximo que tiver lista.
Serra anunciou ontem que o SUS (Sistema Único de Saúde) receberá recursos específicos para possibilitar a realização de transplantes, como por exemplo a manutenção em UTI de pacientes com morte cerebral para manter os órgãos aptos para o transplante.
O ministro também anunciou a criação de uma Câmara de Compensação de Alta Complexidade Hospitalar. Trata-se de um fundo de R$ 50 milhões que será usado para que pacientes de um Estado possam ser atendidos em outro sem que o custo recaia sobre o Estado que está fornecendo o atendimento.


(Colaborou Daniela Falcão, da Sucursal de Brasília)



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