São Paulo, Sexta-feira, 05 de Novembro de 1999
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Atirador que matou três planejava crime desde 92


Marcelo Santa Rosa/Folha Imagem
Meira é conduzido por policiais após prestar depoimento no 96º DP, em São Paulo



"Tinha casal abraçado no chão, gente chorando encolhida. O cara da frente também estava caído. Cutuquei para ele levantar, mas ele também não reagia. Virei o rosto dele. O óculos tinha um furo. Nem estilhaçou. Ele levou um tiro no olho. Varou a cabeça. Um horror. Aí que eu vi que o chão estava lavado (cheio de sangue)."



Miguel Beltran Neto, 20, estudante de direito da Unip

da Reportagem Local

O estudante de medicina que invadiu uma sala de cinema do MorumbiShopping, disparou uma submetralhadora, matou três pessoas e feriu pelo menos cinco afirmou que pensava em matar havia pelo menos sete anos. Em depoimento de três horas, Mateus da Costa Meira, 24, disse à polícia que a idéia passou a persegui-lo quando ele começou a ouvir vozes e a se sentir observado. O crime, disse, seria uma forma de se livrar dos sussurros e de seus perseguidores.
"Ele disse que ouve vozes, que as paredes cochicham no seu ouvido, que se sente observado e que está sendo perseguido", disse o delegado Olavo Reino Francisco, que preside o inquérito.
Segundo o psiquiatra de Meira, José Cássio Nascimento Pitta, o atirador sofre de distúrbio persecutório, um quadro de esquizofrenia em que a pessoa tem mania de perseguição.
Foi por esse problema que o atirador ficou internado dos dias 11 a 20 de outubro numa clínica psiquiátrica. Ele recebeu alta, mas tinha que tomar psicotrópicos.
Meira suspendeu por conta própria a medicação na quinta-feira passada.
O psiquiatra Nascimento Pitta afirmou que o universitário tem um comportamento agressivo desde a adolescência. Segundo ele, a interrupção do medicamento, segundo o psiquiatra, pode ter sido a causa do surto que teria acometido o estudante, que na terça-feira deixou seu apartamento em Santa Cecília (centro) para se hospedar em um hotel na mesma região.
De lá, ele saiu no dia seguinte determinado a cometer o crime. Por volta das 22h15, ele iniciou os disparos de uma submetralhadora recém-adquirida.
Meira disparou pelo menos 40 tiros nas cerca de 25 pessoas que assistiam ao filme "Clube da Luta", na sala cinco do MorumbiShopping. Só parou os disparos porque foi contido por espectadores, que tentaram linchá-lo.
Foram os seguranças do shopping que impediram o linchamento e entregaram Meira à polícia. Ele foi levado ao 96º DP, no Brooklin. Lá está numa cela isolada, porque a polícia teme que ele seja morto pelos demais detentos.
Para o delegado Olavo Francisco, o estudante tinha consciência de seus atos. Por isso, ele foi indiciado ontem por triplo homicídio e cinco lesões corporais, além de porte ilegal de arma e drogas.

Vítimas
Os primeiros a morrer após o ataque do atirador foram a estudante e fotógrafa Fabiana Lobão Freitas e o economista Júlio Maurício Zeimaitis. Os dois foram enterrados ontem, em São Paulo. A publicitária Hermè Luísa Jatobá Vadasz teve morte cerebral declarada.
Nenhuma das outras cinco pessoas feridas por balas ou por estilhaços está em estado grave. As vítimas eram pessoas de classe média e alta que frequentam o shopping.
A família do estudante, que é de Salvador (BA), só deve chegar a São Paulo hoje. O advogado constituído pela família afirmou que ainda é cedo para afirmar se Meira tinha ou não consciência do que estava fazendo e se ele é ou não imputável.
Na madrugada de ontem, a polícia prendeu o mecânico Marcos Paulo de Almeida dos Santos, 24, acusado de ser o homem que vendeu a metralhadora a Meira por R$ 5.000. O mecânico nega o crime, mas Meira afirma conhecê-lo há cerca de um mês.
Segundo o delegado, Santos é o traficante que fornece drogas a Meira, que confessou ser usuário de cocaína, mas negou que estivesse drogado no momento do crime.
Na manhã de ontem, a polícia encontrou no apartamento de Meira, em Santa Cecília (região central), 33 papelotes usados de cocaína e 4 cheios, totalizando 5 gramas. Foram apreendidos também três bilhetes nos quais o sextoanista culpava as drogas por sua atitude.


Participaram desta cobertura: Alencar Izidoro, Alessandro Silva, Antonina Lemos, Aureliano Biancarelli, Cleide Floresta, Chico de Gois, Denise Chiarato, Gonzalo Navarrete, João Carlos Silva, Marcelo Oliveira, Mônica Bergamo, Otávio Cabral, Priscila Lambert e Sílvia Corrêa




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