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São Paulo, domingo, 06 de abril de 2003

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Barragem abandonada ameaça baía de Sepetiba

SERGIO TORRES
ENVIADO ESPECIAL A ITAGUAÍ (RJ)

Com cerca de 50 milhões de litros de água contaminada por metais pesados armazenados de maneira precária, uma barragem abandonada há oito anos ameaça a baía de Sepetiba, um dos pontos turísticos mais interessantes do Estado do Rio.
O "lago" fica a 70 km do centro do Rio, no município de Itaguaí. Está dentro do terreno de 35 hectares (o equivalente a 35 campos de futebol) da Companhia Mercantil e Industrial Ingá, que faliu.
Ao lado da barragem há um dos manguezais da baía, antes ricos em vida marinha. Em 1996, após um temporal, o dique rompeu, e os rejeitos industriais alcançaram o mar. O desastre ambiental é até hoje lamentado na região. A barragem é semelhante à que rompeu em Cataguases (MG).
A atual situação do reservatório da Ingá lembra a de 1996. A barragem está cheia. Se chover, prevêem ambientalistas, o dique poderá arrebentar, e o acidente ocorrido há sete anos se repetirá, em proporções até maiores.
"O entorno do "lago" já está todo contaminado. Se romper aquele dique, como em 1996, ninguém vai mais pescar na área. Você não vai mais recuperar a baía de Sepetiba", disse à Folha o engenheiro químico José Roberto de Souza Araújo, funcionário licenciado da Feema (Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente).
Uma montanha de resíduos de minério, principalmente zinco e cádmio, ladeia a barragem. Quando chove, o material escorre para dentro do "lago", o que causa o aumento de seu volume.
Para o biólogo Mário Moscatelli, a barragem da Ingá é "uma bomba-relógio que um dia vai explodir". "O problema é gravíssimo. Só um dique isola a barragem da baía e dos manguezais", disse.
A Ingá é uma espécie de fábrica fantasma. As instalações estão abandonadas. Os dois tanques de filtragem não funcionam. Só há algum movimento na portaria, onde três vigilantes dão plantão.
A indústria foi montada na década de 50 na ilha da Madeira, então um paraíso ecológico. Hoje, a ilha existe apenas no nome da localidade. Aterros juntaram a Madeira ao continente.
Durante quatro décadas a Ingá produziu lingotes de zinco para exportação. Os rejeitos líquidos eram depositados sem tratamento na baía de Sepetiba.
Com a pressão dos ecologistas, após 30 anos de funcionamento foram construídos dois tanques de filtragem e uma estação de tratamento. Já era tarde. Pesquisas da Universidade Federal do Rio de Janeiro indicaram, em 1983, que os manguezais estavam contaminados por metais pesados.
Secretário de Meio Ambiente no governo petista de Benedita da Silva (abril-dezembro de 2002), Lizt Vieira disse que chegou a estudar a contratação de uma empresa para a limpeza do local, mas o projeto não foi adiante.
Já a secretária de Meio Ambiente de Itaguaí, Maria Tereza Fagario Filho, critica Estado e União por não solucionar um problema ambiental de quase 50 anos.
"Não temos poder de polícia. O que tínhamos de fazer, com encaminhamentos às autoridades estaduais e federais, fizemos. Se a gente não tem resposta ou providência, a gente fica limitado. Solução tem. Dá para recuperar a área. Mas quem vai assumir esse trabalho, quem vai investir? Nós temos limitação financeiras", disse ela.
O Ibama formou em 2002 um grupo de trabalho para estudar o caso da Ingá. Por causa do acidente em Minas Gerais, o coordenador do grupo, Nilvo Alves da Silva, não poderia falar sobre o assunto. O empresário Flávio Barreto, que presidiu a indústria até a falência, não foi localizado.


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