São Paulo, sexta-feira, 06 de maio de 2005

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SAÚDE

Porta-voz do Departamento de Estado diz que a prática espalha a doença e defende a não-liberação de verba para ONGs do país

Governo Bush culpa prostituição pela Aids

FABIANE LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL

O porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Richard Boucher, disse que a prostituição é causa da expansão da epidemia de Aids ao comentar a decisão do Brasil de rejeitar o veto do governo Bush ao financiamento de ONGs brasileiras que defendem trabalhadores do sexo.
Ele também destacou que seu país tem impedimentos legais para ajudar as ONGs nessas condições. "Apenas queremos saber que elas [as ONGs] estão tão comprometidas quanto nós em combater a Aids e também em combater a prostituição e o tráfico sexual, que têm feito parte da expansão da Aids", disse Boucher anteontem em encontro com jornalistas em Washington para falar de temas internacionais.
A declaração, divulgada ontem pela embaixada dos EUA no Brasil, gerou uma forte reação do governo brasileiro. Para Pedro Chequer, coordenador nacional de DSTs e Aids do Ministério da Saúde, Boucher retomou um argumento ultrapassado, de que a Aids é um problema de grupos de risco -entendimento que existia no início da epidemia, há mais de 20 anos, e que foi superado pelas evidências científicas de que comportamentos de risco, como sexo sem camisinha, é que são responsáveis pela expansão da doença. A Aids cresce entre mulheres casadas por seus maridos não usarem camisinha em outras relações.
"Você pode ter uma prostituta com risco quase zero e pode ter pessoas lá da igreja do Bush com risco altíssimo. Depende da prática. A questão é outra, lógico que é a questão do uso do preservativo", reagiu Chequer.
O governo brasileiro acusou os EUA de tentarem interferir na política nacional de Aids, ao vetar o financiamento a ONGs que defendam os trabalhadores sexuais e, com o aval de movimentos sociais, anunciou na semana passada o rompimento de acordo que previa um repasse de US$ 22,5 milhões (cerca de R$ 56,2 milhões) até 2008 para as ONGs.
As declarações de Pedro Chequer têm repercutido na imprensa norte-americana, que afirma que o Brasil é o primeiro a enfrentar a política do governo George W. Bush para as questões sexuais, a chamada política "ABC", que prega a abstinência em primeiro lugar, fidelidade (o B é da expressão em inglês "be faithful) e camisinha só em último caso. A embaixada dos EUA informou que a decisão do Brasil ainda é discutida pelo governo norte-americano.

Impedimento legal
O porta-voz do Departamento de Estado destacou que, pelos termos da lei de 2003 de Liderança Contra a Aids, a Tuberculose e a Malária dos EUA, o país tem a obrigação legal de assegurar que nenhum financiamento seja fornecido a organizações que não possuam uma política explícita de oposição à prostituição e ao tráfico sexual. O Brasil é contra o tráfico de seres humanos para o sexo.
Boucher disse por fim que os EUA não interferiram na maneira como as ONGs brasileiras poderiam combater a prostituição. "Não ditamos a maneira como elas terão que implementar esse compromisso ou essa política. Não especificamos como elas terão que expressá-la em ação."


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