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Filho diz não haver processo nem provas contra Cukurs
Gunars diz que seu pai não usaria nome verdadeiro no Brasil se fosse criminoso
Caminhoneiro, herdeiro de aviador diz que perseguição começou quando Herbert não quis vender a rede de pedalinhos que tinha no Rio
DA REPORTAGEM LOCAL
Gunars Cukurs reza todos os
dias diante das imagens de Jesus Cristo, Santos Dumont e de
seu pai, Herbert. Pendurados
em ordem hierárquica em uma
das paredes do galpão onde
mora, às margens da represa
Guarapiranga, em São Paulo, os
retratos compõem um altar.
Próximo há vários retratos
de Nossa Senhora de Fátima
em um biombo. A referência
não é em vão. A primeira casa
dos Cukurs no Brasil, em Niterói (RJ), hoje é uma igreja em
homenagem a Fátima. Em
frente, um Buda, um chapéu de
cangaceiro e uma estátua de
Maria Bonita. "Meu pai é injustiçado como Jesus e Lampião",
diz Gunars, cristão luterano.
Dentro do galpão ainda há
um arquivo com relatos sobre
as viagens de Herbert ao Japão
e à Gâmbia, as medalhas recebidas após a Primeira Guerra
Mundial como herói nacional
da Letônia e recortes de jornais
brasileiros que mostram a
construção dos pedalinhos da
lagoa Rodrigo de Freitas, no
Rio, e as peripécias do aviador
letão no Brasil. "Ninguém que
voa pode ser um assassino.
Aviadores são idealistas."
Viúvo, aos 76, o filho mais velho de Herbert ocupa boa parte
do tempo com a reforma de seu
caminhão e de um pequeno
avião. Sem aposentadoria e
sem dinheiro, continua caminhoneiro. Já o avião mantém a
tradição familiar. O galpão onde Gunars mora, além de casa e
museu, é oficina mecânica.
Os argumentos
Gunars é capaz de passar o
dia defendendo o pai. Pela ordem, diz que, se Herbert fosse
criminoso de guerra, não teria
usado o nome verdadeiro no
Brasil. Também afirma que o
pai chegou com emprego certo
e que nenhum criminoso aceitaria ter se exposto na imprensa e divulgado sua empresa.
Depois, diz que não há nada
contra Herbert no tribunal de
Nuremberg e que a polícia brasileira lhe deu documento em
1951 dizendo não haver nada
contra ele, após acusações de
que era nazista. "Não há prova
nem processo contra meu pai."
Ele nega que Herbert fosse
anti-semita e nazista. Gunars
diz que, com a família, seu pai
trouxe uma judia da Europa,
Miriam Kaitznen. Também diz
que, pouco antes de ser assassinado, em 1965, Herbert teria
jurado à família que nunca "sujou as mãos com sangue judeu".
"As palavras não são bonitas,
mas é o jeito como meu pai falava", explica Gunars, que diz que
o pai foi forçado a se juntar aos
alemães para não ser morto na
invasão da Letônia. "Como poderia ser nazista alguém que lutou contra os alemães na Primeira Guerra Mundial?"
Gunars conta que os problemas surgiram quando os pedalinhos da Rodrigo de Freitas
prosperaram. O negócio surgiu
em Icaraí (Niterói) e se expandiu para a Urca e Copacabana.
Segundo ele, Herbert recebeu proposta para vender os
pedalinhos e recusou. No outro
dia, sua casa apareceu pintada
com inscrições chamando seu
pai de nazista. Para sustentar a
tese da conspiração, diz que as
ofensas vieram acompanhadas
de uma campanha dos "jornais
comunistas". "Havia muitos interesses comerciais em jogo."
Gunars, 41 anos após a morte
do pai, diz se orgulhar pelo patriarca ter sido um herói da
aviação e por ter virado um brasileiro. Gunars afirma que uma
das poucas vezes em que viu
Herbert chorar, de alegria, foi
quando os militares instituíram a ditadura de 1964.
(MARIO CESAR CARVALHO e LEANDRO BEGUOCI)
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