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GILBERTO DIMENSTEIN
O lado bom do desemprego
Investigações produzidas nas
universidades americanas vêm
associando, com cada vez mais
dados, o desemprego ao aumento de casos de suicídio.
Os estudos mostram que o
suicídio faz parte de uma galeria de distúrbios psicológicos.
Cresce o consumo de álcool e
drogas, provocando maior número de internações psiquiátricas -e separações conjugais.
Uma das explicações para essas tragédias foi detectada no
Brasil, depois que uma professora de psicologia coordenou
entrevistas com 180 desempregados. Constatou-se que eles se
sentiam culpados, entrando
num processo esmagador de
baixa estima -um dos fatores
que desencadeiam depressão.
Coordenadora da pesquisa,
Maria Nilde Mascellani, da Faculdade de Psicologia da PUC,
notou que os desempregados
achavam, no fundo, que mereciam estar mesmo na rua; afinal, não estudaram.
O processo perverso é que eles
vêem em si a razão da culpa,
mas não na sociedade que deixou de lhes dar chance de qualificação, frequentando a escola.
Por mais doloroso que seja, o
desemprego tem um lado bom.
É um dos detonadores de uma
revolução silenciosa no Brasil,
capaz de mexer nas estruturas
de poder e alavancar a cidadania.
Num ritmo jamais visto em
nosso país aquece a demanda
por conhecimento, envolvendo
das categorias mais altas e
bem-remuneradas até o principiante operário.
Os sindicatos mesclam, agora, as tradicionais demandas
por salário com investimentos
em qualificação profissional,
um dos anestésicos contra o desemprego. Sindicatos viram, na
prática, escolas.
Brigam com os patrões para
que ajustem cada vez mais os
tradicionais centros de treinamento para que se encaixem às
novas necessidades do mercado.
Preocupadas com as falhas
do setor público, empresas
montam suas próprias escolas
de primeiro e segundo graus.
Um dos fatos novos mais relevantes do país é a avalanche de
matrículas no chamado ensino
médio, o antigo colegial. São 8
milhões de estudantes matriculados no segundo grau, a imensa maioria em escolas públicas.
Apenas um detalhe ajuda a
explicar essa correria: a Honda
no Brasil exige de seus faxineiros colegial completo.
A tendência é igualmente
agitada para os executivos,
obrigados a se reciclar permanentemente.
A revista "Exame" calcula
que as 500 maiores empresas
brasileiras tenham gasto, no
ano passado, US$ 650 milhões
para treinar seus dirigentes.
Basta abrir o jornal e ver
quantos seminários e cursos
são oferecidos, trazendo personalidades internacionais.
Ou, então, ver a demanda por
cursos e professores de inglês;
requisito que significa a chance
de estar empregado ou na rua.
Diante do aumento da procura, aumento da oferta de conhecimento.
Apesar de todas (e merecidas)
críticas, melhoram as faculdades privadas, pagando salários
mais competitivos aos professores.
Universidades americanas
oferecem cursos à distância,
com aulas complementares feitas no Brasil. Os programas de
educação continuada da Fundação Getúlio Vargas, em São
Paulo, estão superlotados.
Além do crescente acesso à
Internet, as TVs por assinatura
oferecem informação qualificada para avanço profissional.
Exemplos: TVs Senac, Universitária e Futura.
O mercado editorial se adapta com rapidez.
Jornais cobrem mais e mais
temas ligados à educação e recursos humanos. As disputas
por leitores produziu uma
guerra de ofertas de bens culturais, tão criticada entre jornalistas. Bobagem.
Na prática, os brindes estão
aumentando, como nunca, o
acesso a bens culturais como
enciclopédias e material didático. Fosse um plano organizado pelo ministério ou secretarias da educação para democratizar o saber, seria inviável
financeiramente.
Surgem publicações especializadas como "Você", da Editora
Abril, voltada a recursos humanos. A editora Globo entra
na guerra das revistas, lançando "Época".
O fato óbvio: na medida em
que mais pessoas estudam para
se manter no mercado de trabalho, sobe a gula por conhecimento.
A sociedade é obrigada, na
marra, a preparar melhor seus
trabalhadores, valorizando a
educação, antes que fiquem obsoletos.
O resultado é que, também na
marra, somos obrigados a ter
melhores escolas; logo, melhores cidadãos.
Da mesma forma se se acabou com a escravidão por motivos econômicos, vamos ter de
acabar com a ignorância para
sobreviver numa economia globalizada e cada vez mais competitiva.
PS - Uma das coisas que me
deixam mais espantados na
minha volta de Nova York é ver
como, apesar de tantos sinais
de evolução, uma expressiva
parcela dos brasileiros acredita
que o Brasil está piorando.
Pode-se até dizer que poderíamos estar bem melhor, culpando governos e elites por
omissão e incompetência (concordo em boa parte). Temos
ótimas iniciativas públicas; a
bolsa-escola, do PT, é das mais
elogiáveis; o Ministério da
Educação tem acertado muito
mais do que errado. Reproduzem-se inspiradores parcerias
de governo com a comunidade.
Pode-se até dizer também,
considerando nossas possibilidades, que somos um lixo social (e concordo plenamente).
Não há base na realidade, porém, para sustentar que a nação esteja indo para trás. O notável da experiência brasileira
é a vitalidade da sociedade,
numa reação à lerdeza oficial.
Excesso de pessimismo é uma
mentira que mostra pelo menos
uma das seguintes verdades:
burrice, ignorância, demagogia
ou doença mental.
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