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Neguinho da Beija-Flor encara o câncer e se prepara para a Sapucaí
Minutos antes de dar o grito "olha a Beija-Flor aí, gente!", a voz principal da escola será homenageada por todos os puxadores de samba do Grupo Especial
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
Um dos símbolos da vaidade
de Neguinho da Beija-Flor era
não falar de sua idade. Agora,
ele conta até com orgulho: "59".
"Para quem ia morrer, por que
esconder a idade? Estou no lucro. Acabei com essa vaidade."
Em julho do ano passado,
após ter tido um forte sangramento e ter ouvido do médico
que estava com câncer, o atual
mais conhecido intérprete de
sambas-enredo do país -posto
que herdou de Jamelão (1913-2008)- foi para a mesa de cirurgia e dela saiu sem 40 cm de
intestino, afetados pelo tumor.
Uma semana depois da operação, já dava entrevistas falando de sua doença. "O público
sabe dos meus discos, dos meus
shows, das minhas viagens, do
carro que eu tenho...Tem que
saber das coisas ruins que estou
passando também. Eu cresci no
meio do câncer; vi quantos amigos eu tenho em todo o Brasil e
até no exterior", diz.
Passou a receber enxurradas
de mensagens de apoio, muitas
delas vinculadas a religiões diversas. "Aceito tudo", avisa,
ecumênico. A doença o ajudou
a mudar prioridades: "Minhas
preocupações eram viagens,
shows, conta bancária. Meu lado espiritual estava esquecido.
Eu não sabia nem rezar. Mas a
necessidade faz o sapo pular."
Além das orações, Neguinho
enfrenta o câncer com duas
sessões de quimioterapia por
mês. Já fez seis, perdeu todos
os pelos, e até 17 de maio fará
mais seis. A sétima será na próxima quinta, dez dias antes de ir
à avenida Marquês de Sapucaí
para ser, pelo 35º ano consecutivo (com 11 títulos), a voz principal da Beija-Flor de Nilópolis.
A médica que aplica a quimioterapia não aceitou interromper as sessões às vésperas
do Carnaval, como ele sonhava.
Mas, mesmo angustiado pela
"queimação" que sente no corpo em razão das aplicações, ele
diz que cantará durante os 80
minutos de desfile. "E vai sobrar, você vai ver. Estou tomando vacinas que me fortalecem,
vou tomar muita vitamina até o
dia D e vou conseguir."
E seu coração será posto à
prova antes do desfile. Ainda na
concentração, um juiz de paz e
um padre o casarão com Elaine
Reis, sua companheira há quatro anos e com quem tem um de
seus cinco filhos -além de quatro netos. E minutos antes de
dar o grito "olha a Beija-Flor aí,
gente! Chora, cavaco!", que inventou em 1978, será homenageado por todos os puxadores
de samba do Grupo Especial.
"A Beija-Flor me proporcionou tudo. Sem ela, eu não conheceria o mundo", diz ele, que
recebe do presidente de honra
da agremiação, o bicheiro Aniz
Abrahão David, o Anísio, sem
ter um salário formal.
Luís Antonio Feliciano Neguinho da Beija-Flor Marcondes -seu nome completo desde
2008- faz planos: lançará seu
31º disco e o 2º DVD, "Nos Braços da Comunidade". Quer
completar 60 anos tendo vencido a doença. "Câncer não é uma
pneumoniazinha. É vai ou fica."
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