São Paulo, domingo, 8 de fevereiro de 1998

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Policiais dizem que negócios são da família e que não burlam lei

da Reportagem Local

A maioria dos policiais envolvidos com empresas de segurança diz que não gerencia o empreendimento, apenas participa dele como sócio-cotista, o que não é vedado pela legislação.
A Folha ouviu 14 dos 15 policiais citados na reportagem -três falaram por meio dos advogados e um não foi localizado.
A reportagem procurou o sargento da Polícia Militar Marco Antonio Lopes da Silva, sócio da Mirantte Serviços de Segurança Ltda., na sede da empresa, em Santana (zona norte de São Paulo), na última quarta-feira, mas ele não estava.
Na sexta, a reportagem ligou para a Mirantte, e a secretária informou que Silva estava em uma reunião. Em nova ligação, uma funcionária disse que Silva tinha saído. Ele não voltou a ligar. Leia a seguir o depoimento dos policiais ouvidos:
Pedro Pereira Matheus, coronel da reserva da PM: "Existe um negócio que se chama lei ou doutrina ou regulamento. É useiro e vezeiro dizer que policial, que funcionário público não pode ter isso, não pode ter aquilo. O que o funcionário público não pode é ser gerente de alguma coisa. Mas ser cotista ele pode. Como as empresas de segurança são firmas limitadas ou sociedades anônimas, com cotas, o policial pode adquirir a cota que quiser. No caso da minha empresa de segurança, ela não está no meu nome porque não tinha interesse, está no nome da minha mulher. Mas hoje eu sou da reserva, eu posso pôr no meu nome."
Roberval Ferreira França, capitão licenciado da PM: "Verificamos que a legislação nos permitia participar como sócios-cotistas de empresas de sociedade limitada. Então, como era uma ação perfeitamente legal, nós trilhamos esse caminho. Me subscrevi no contrato social da empresa, obviamente, já respaldado pela legislação. Eu não exercia o chamado ato de gerência. Eu tinha apenas participação societária. Quando senti necessidade de me fazer presente na empresa, eu pedi licença não remunerada da polícia. Isso me dá uma situação perfeitamente regular do ponto de vista legal para que eu possa exercer outra atividade. O Marco Antonio Lopes da Silva (sócio da Mirantte) é policial também. Não sei se está na ativa."
Miguel Gonçalves Pacheco e Oliveira, delegado do Deplan (Departamento de Planejamento e Controle): "Não posso, na condição de delegado, ficar dando entrevista. O delegado-geral proíbe isso. A empresa é da minha família. Evidentemente eu tenho interesse nela. Não escondo que tenho empresa, mas eu não trabalho para ela. Eventualmente, dou assistência. O que me impede de estar lá? Tenho liberdade de ir e vir."
Sobre o conflito ético entre segurança pública e segurança privada: "Considero ético todo trabalho honrado."
Sobre a incompatibilidade dos bens que possui com o salário de delegado: "Estou no ramo de segurança antes de ser delegado, desde 1979. Virei delegado em 1984. Antes, eu era da Polícia Federal. Quem tem empresa durante 20 anos constitui um patrimônio. Não dá para vincular meu patrimônio com o salário de policial."

Aloizio Pires de Araújo, delegado do 7º DP: "A gente cumpre o horário normal na delegacia e procura ajudar a família no negócio. Sou apenas sócio-cotista, não estou gerenciando diretamente a empresa. Uso o horário livre para contribuir na parte operacional. Não vejo nada que fira algum código de ética ou alguma moral com relação a usar um profissional formado em segurança pública na iniciativa privada. Acho até bom. Bom porque você tem outra ocupação de maneira informal. Você contribui para melhorar seu padrão de vida, dá uma educação melhor para seus filhos. Seria difícil (viver com salário de policial). Eu passo aqui em hora de folga, de manhã ou à tarde. Passo todo dia. Uso estritamente as minhas folgas."
Ivaney Cayres de Souza, delegado do Denarc (Departamento Estadual de Investigações sobre Narcóticos): Na última quarta-feira, o advogado da Pollus, Márcio Lobregat, informou que Souza estava em Nova York e só voltaria no sábado. No dia seguinte, Lobregat disse que o advogado Paulo Esteves falaria por Souza. Esteves confirmou que Souza foi sócio da Pollus. "O Ivaney teria vendido a empresa e haveria um documento entre eles (o delegado e os compradores) determinando o sigilo na operação. Não conheço o documento." Na última sexta-feira, o advogado disse que não havia recebido o documento. A Folha voltou a procurar a diretoria da Pollus e foi informada que Esteves continuava respondendo pelo delegado. O advogado informou que não havia conversado com Souza novamente e que só poderia esclarecer o que ocorreu depois de encontrar seu cliente.




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