São Paulo, quinta-feira, 08 de março de 2001

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Velório na TV inicia criança no ritual da morte

DA REPORTAGEM LOCAL

Irene acreditava que sua mãe tinha virado estrela e que viveria sempre. À noite, o pai a segurava no colo e juntos procuravam a estrela.
Irene tem 7 anos e tinha 4 quando a mãe morreu em um acidente. Hoje, já sabe que a mãe não voltará mais.
"Por algum tempo, ela agarrou-se à esperança de que a mãe voltaria, como uma defesa para sua sobrevivência", diz a psicóloga Luciana Mazorra. "Mas é sempre importante dizer que a pessoa não voltará."
Irene valeu-se da fantasia da "estrela viva", criada pelo pai, para superar a perda da mãe. Mesmo os adultos às vezes se valem de recursos, geralmente associados à religião, lembram os especialistas. Acreditam que alguém foi para o céu e que seu espírito continua presente.
A doença, a morte e o velório de Mário Covas, expostos todos os dias na TV, foram acompanhados por crianças e adultos sentados no mesmo sofá -às vezes, no colo.
Para os especialistas, esse velório, ao mesmo tempo coletivo e familiar, é uma vivência importante para as crianças. Ajudará a reduzir sentimentos de culpa e facilitará o diálogo no caso de morte na família. "As crianças tendem a se sentir responsáveis", diz Luciana Mazorra, que conclui mestrado na PUC-SP sobre "fantasias de crianças enlutadas".
No grupo de oito crianças que perderam a mãe, o pai ou os dois, todas se sentiam culpadas. As menores, entre 3 e 6 anos, acreditavam que o genitor ainda voltaria. As maiores queriam acreditar nisso. Rosa, hoje com 7 anos, achava que um anjo tinha levado o pai ao céu, como dizia a mãe. Como nunca encontrou uma escada, vivia angustiada.
A psicóloga Regina Trotto, do Rio, diz que é importante falar com acolhimento, mas sem omitir os fatos. "A realidade de morte tem fim, o imaginário da criança é infinito", afirma. (KS e AB)




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