São Paulo, quarta-feira, 08 de março de 2006

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VIVENDO COM O INIMIGO

Aposentada sofre agressões do marido desde o primeiro ano de união e não conseguiu se separar

Rotina de violência de Maria dura 46 anos

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Dentro de quatro anos, a aposentada Maria, 66, completa "bodas de ouro de violência doméstica". Casada há 46 anos e mãe de um filho de 45, ela conta que desde o primeiro ano de união, o marido a maltrata. A partir dos anos 80, começou a espancá-la, chegando a desfigurar seu rosto em 1999.
Desde então, ameaçada de morte, ela se tranca no quarto à noite. Há um ano, recebe atendimento psicológico na Casa da Mulher Lilith, na Vila Alpina.
Ela ainda mora com o marido porque diz não ter condições para se sustentar. Leia a seguir o seu depoimento.

 

"Casei com meu primeiro namorado. Antes de a gente se casar, ele não parecia uma pessoa violenta, mas, depois, revelou-se outra pessoa, um sádico. Com o tempo as coisas só pioraram. No ano de 1980, descobri que ele tinha uma amante. Fui cobrar explicações e ele me espancou muito. Ele me jogou no chão e começou a me socar na cabeça, no rosto. Cheguei a desmaiar. Pensei em denunciá-lo à polícia, mas uma vizinha me convenceu a desistir e a dar uma chance a ele. Não adiantou nada. Volta e meia ele voltava a me bater. Uma vez, me malhou com o fio do telefone. Meu supercílio abriu e levei três pontos. Outra vez, veio por cima de mim, comecei a correr pela casa, deslocando meu joelho esquerdo.
Tinha tanto medo e vergonha que, no hospital, sempre inventava alguma história. Em 90, ele me deu um soco no nariz, que sangrou muito. Enchi-me de coragem e registrei um BO. Mas, sem ter como me sustentar, desisti de levar o processo adiante. Em 99, outra surra quase desfigurou meu rosto.
Depois disso, ele não me espancou mais, mas me ameaça todo dia. Dizia que iria me enforcar enquanto eu estivesse dormindo. Passei então a trancar a porta do quarto. Agora, fica desejando a minha morte. Todas as vezes que saio de casa, ele diz: "Tomara que uma carreta passe por cima de você".
Há um ano, procurei a casa Lilith. Comecei a fazer terapia e a tomar antidepressivo. Sinto-me fortalecida e com coragem de batalhar por uma separação. Não quero completar "bodas de ouro de violência". Quero poder ter um pouco de tranqüilidade neste resto de vida."


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