São Paulo, quarta, 8 de julho de 1998

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Torcedor tapuia confunde alhos com bugalhos

BARBARA GANCIA
Colunista da Folha


Ufa! Como se falou besteira nesta Copa do Mundo!
Uma das que mais me deixam tiririca é aquela descoberta da pólvora feita por alguns colegas bairristas de que, na França, cachorro é mais bem tratado do que imigrante.
Ora, ora. E a cachorrada não merece? Por acaso cachorro tira emprego de francês? Por acaso cachorro solta bomba no metrô de Paris?
Brincadeiras à parte, brasileiro acha plausível comparar cachorro com gente porque gosta errado de cão.
Não entende que animal deve ser tratado e amado como animal. Prefere considerar o cachorro um subser humano e chega ao cúmulo de comprar a idéia batráquia daquele cantor, o Eduardo Dusek: "Troque seu cachorro por uma criança pobre". Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, como diz o ditado popular.
Mas achar que crianças podem ser intercambiáveis com cães não deixa de dizer algo sobre nossa auto-estima e nosso grau de preconceito.
Pois, da mesma forma que gostamos errado de cachorros, também torcemos errado pela nossa seleção.
Basta dizer que, no dia do primeiro jogo do Brasil, as autoridades registraram 81 homicídios na Grande São Paulo.
O pessoal veste orgulhoso a camisa da seleção e sai gritando "Brasil, Brasil!".
Mas, na pressa de chegar a sua casa para ver o jogo, é capaz de atropelar o pedestre igualmente brasileiro que cruza a rua na sua frente.
Quantas vezes não ouvimos a expressão "pátria" jogada no meio de uma frase sobre a seleção brasileira?
Será que nossa noção de pátria é tão merreca que pode ser reduzida a um mero campeonato de futebol?
Quem torce pela seleção da forma certa e saudável pega emprestado o verde-amarelo da bandeira para vibrar com o espírito alegre do brazuca.
Torce pelo talento e pela arte do nosso futebol. E sabe que o orgulho que sentimos da nossa superioridade no esporte bretão não pode ser confundido com patriotismo.
Pois, nesse quesito, ainda engatinhamos. E continuamos devendo aos índios e paraguaios que massacramos, aos africanos que escravizamos e aos nossos filhos, que deixamos morrer de fome e de falta de assistência médica na porta dos postos de saúde deste nosso Brasil varonil.

QUALQUER NOTA

Gol
Ao defender Bebeto, quando ele foi substituído no jogo contra a Dinamarca, Romário deu uma lição de esportividade e cavalheirismo em jogadores como Zico, Pelé e Maradona, que ainda não aprenderam a usar a língua para elogiar colegas do mesmo nível.

Sol com peneira
Por que será que, no jogo França x Itália, a platéia quase não foi televisionada? Terá sido para esconder o boicote de ingressos que a organização da Copa promoveu contra a torcida italiana?

Mais um
Não param de chegar exemplos do pé-frio da Pepsi. Um leitor escreve para lembrar que um concurso da empresa nas Filipinas acabou gerando um tumulto envolvendo 800 mil pessoas.

E-mail:barbara@uol.com.br



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