UOL


São Paulo, sexta-feira, 08 de agosto de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

HABITAÇÃO

Mais de 870 policiais se prepararam para ação, mas não houve resistência; ocupantes disseram que invasões continuarão

Sem-teto deixam terreno da Volks no ABC

CHICO DE GOIS
GILMAR PENTEADO
ALESSANDRO SILVA

DA REPORTAGEM LOCAL

A tropa de choque foi preparada para uma guerra, que não aconteceu. Mas o efeito visual de 800 policiais, mais 70 homens da cavalaria, 30 cães, dois helicópteros, 140 veículos e a informação do coronel Tomaz Alves Cangerana, comandante da tropa de choque, de que não iria negociar fizeram com que as cerca de 4.000 famílias que ocupavam o terreno da Volkswagen desde o dia 19, em São Bernardo do Campo, deixassem o local sem resistência.
Ao saírem da área na região do ABC paulista, muitos choraram e diziam não ter para onde ir. Um grupo de 300 pessoas, incluindo várias crianças, decidiu dormir na praça em frente à prefeitura.
Líderes do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) afirmaram que a retirada "não era uma derrota" e disseram que as invasões continuarão. "As ocupações vão aumentar, sim", disse João Batista Costa, um dos líderes.
Uma parte das famílias utilizou 25 ônibus cedidos pela montadora para ir à igreja Jesus de Nazaré, na Vila São José, bairro próximo ao acampamento. A intenção do movimento era permanecer no local enquanto discutia-se uma solução para o problema.
Quando chegaram à igreja, porém, o padre Sante Collina disse que não fora informado de que os sem-teto utilizariam o templo como abrigo. "Só se eu colocar gente embaixo da minha cama", afirmou ele, que chegou a dar abrigo em sua paróquia, em 1980, ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, então perseguido político.
Sem o aval do padre, os sem-teto tiveram de abandonar o local. Vários desabrigados já haviam retirado seus pertences dos ônibus e colocado na calçada e tiveram de recolocá-los nos veículos. Depois, seguiram para o paço municipal.
Uma outra parte dos sem-teto -cerca de 300 pessoas-, que não havia seguido para a igreja, permaneceu em frente ao terreno. De lá, seguiu em passeata pelo centro da cidade até o paço municipal, onde uma comissão foi recebida pelo prefeito Willian Dib (PSB). Durante a passeata, a maioria das lojas da rua Marechal Deodoro, uma das principais da cidade, fechou suas portas.
Enquanto os manifestantes iam a pé, sete caminhões com sem-teto e seus pertences seguiam para o paço quando foram desviados pela Polícia Militar.
No km 18 da rodovia Anchieta, os sem-teto foram obrigados pelos PMs a sair dos veículos. Duas bombas de efeito moral foram usadas. Manifestantes foram agredidos com cassetetes pelos policiais (leia texto nesta página).
Boa parte das famílias que estavam acampadas no terreno da Volkswagen, porém, acabou voltando para seus locais de origem, nas favelas das redondezas ou na casa de parentes.
Segundo a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano), que no dia anterior fez um cadastro no qual contou 3.300 famílias e havia mais 800 senhas distribuídas, somente 300 delas não teriam para onde ir. As demais moravam em favela ou com parentes.
"Esse levantamento não merece crédito. Faltou cadastrar pessoas e não se sabe para qual foi a finalidade disso", disse Eliana Lúcia Ferreira, advogada do MTST.
A informação de que a polícia iria cumprir o mandado de segurança obtido pela empresa anteontem chegou no acampamento pouco antes das 6h, embora na noite de anteontem as lideranças do MTST já acreditassem que juridicamente não haveria mais nada a fazer para mantê-los na área.
Às 6h, a polícia fechou a rua. A tropa de choque chegou às 8h. "Vamos negociar somente o tempo para eles deixarem o local", informou o coronel Cangerana, que, depois de falar com as lideranças do acampamento, concedeu 30 minutos para a saída. Antes de deixarem o local, alguns barracos foram incendiados.
Às 15h, depois de a tropa de choque entrar na área e destruir as barracas já vazias, o terreno voltou a ser da Volkswagen.


Texto Anterior: Polícia impede assalto a banco em secretaria
Próximo Texto: Reunião termina em ameaças
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.