São Paulo, domingo, 08 de outubro de 2006

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SAÚDE/ PSICOLOGIA

Câncer e tratamento devem ser explicados às crianças

Livro aborda de forma lúdica e sincera temas como morte, rotina e família

Paciente sente medo, culpa, e revolta. Pais precisam manter tarefas cotidianas e mostrar que acreditam no futuro e na recuperação

CONSTANÇA TATSCH
DE REPORTAGEM LOCAL

Ficar careca, receber injeções, vomitar, ter medo de morrer. O câncer assusta a todos, mas, quando as crianças são as vítimas, fica mais difícil explicar e entender todo o processo de combate à doença.
Pensando nisso, duas psicólogas e uma publicitária escreveram um livro contando o dia-a-dia de quatro crianças doentes no hospital. Juntou-se a elas, como colaborador, o desenhista Mauricio de Sousa, que fez as ilustrações. Na história, quatro superamigos, que representam diferentes formas do tratamento, incentivam os personagens a lutar contra o Monstrengo, a personificação do câncer. Indicado para pacientes de até 12 anos, o livro "A Batalha do Bem contra o Mal" aborda temas como morte, quebra da rotina, relação com o médico, família e tratamento. A obra será lançada no dia 30 e será distribuída em todos os centros de oncologia do país.
"A primeira hospitalização dá muito medo. Elas se perguntam por que estão no hospital? Têm medo da morte e dos exames", diz Maria Letícia Cavalcanti Rotta, uma das autoras do livro e psicóloga da Associação de Apoio à Criança com Câncer. Outros sentimentos presentes são a revolta e a culpa. "Acontece a revolta sim. A criança se questiona: por que eu? O que eu fiz de errado? Aí vem as mais variadas teorias, "eu bati no meu irmão", "briguei com a minha mãe". E os pais também pensam isso. É um tratamento permeado pela culpa, que vem para justificar o injustificável", explica Letícia.
Ela conta que, às vezes, as crianças pensam em desistir. "A gente quer despertar espírito de luta, mas tem que ter cuidado, porque eles sabem que é difícil, eles estão vendo os amiguinhos morrerem", afirma.
Quem está perto não deve mostrar pena e é melhor evitar as cenas de desespero. "Deve mostrar que acredita no futuro dele. A gente incentiva a estudar, a pensar o que vai ser quando crescer. Parar de estudar é como se não tivesse amanhã. E a criança pensa "tá vendo, não acreditam na minha cura"."
A psiquiatra do Hospital do Câncer e uma das autoras do livro "A Criança com Câncer -O que devemos saber?", Célia Antoneli, sempre diz a verdade aos pacientes sobre a doença e o tratamento. "Dependendo da idade, fazemos associações. A gente conta, mesmo que ela não entenda direito. Se você não disser a verdade, ela não vai confiar nunca e essa relação é muito de confiança." Em média, há 70% de chance de cura nas crianças, e as internações também tendem a ser mais breves. Segundo a médica, mesmo na leucemia, cujo tratamento dura dois anos, os pacientes ficam dois meses no hospital. O resto é ambulatorial.
Quem também sofre com esse processo e precisa de atenção é a família. "Essas situações pedem muita força", diz Ana Maria Massa, psicóloga e coordenadora do Centro de Referência da Infância e Adolescência da Unifesp. "Em razão disso tudo, o outro filho fica meio de lado. Mas ele também está passando por um problema, que pode não ser tão grave, mas que ele não vai saber resolver." Ela sugere que a família tente preservar o cotidiano e, quando possível, saia para passear, traga visitas, tome um lanche junta. "A vida está aí para aproveitar, ainda mais nessa situação."


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