São Paulo, domingo, 9 de agosto de 1998

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O pavor `Anestesia´, afirmam vítimas

PRISCILA LAMBERT
da Reportagem Local

Apesar do crescente pavor, as vítimas de atos de violência sexual são tomadas por um um sentimento de "anestesia", um tipo de defesa natural para diminuir o sofrimento durante o estupro.
"As pessoas perguntam por que eu não reagi, o que me enfurece. Eu só pensava em sobreviver. Me senti anestesiada, não conseguia falar ou me mexer. É como se eu não estivesse dentro do meu corpo", conta Fátima (nome fictício), 32, vítima do "maníaco da Aclimação", que atacou cinco mulheres na zona sudoeste de São Paulo no início deste ano.
Outras vítimas de violência sexual ouvidas pela Folha relataram sentimentos muito semelhantes. A "anestesia", no entanto, não diminui o desespero, que cresce a cada minuto, segundo elas.
Durante o ato, todas contam que choravam muito e tentavam ocupar a cabeça rezando. Pensavam na família e engoliam a raiva como questão de sobrevivência.
"A proximidade da morte faz a gente relembrar pessoas queridas, o que nos dá forças para aguentar tudo", diz a recepcionista G.A., 20, estuprada na última terça-feira pelo "maníaco do Jabaquara", que teria cometido outros quatro estupros na região. "É a maior humilhação que uma pessoa pode passar na vida. A dor física passa, mas a moral fica."
G. foi levada a um terreno baldio, onde foi obrigada a fazer sexo oral e anal sob ameaça de morte. "Enquanto me levava ao local, me ofereceu cigarro com naturalidade e ainda ficou irritado porque eu não aceitei", conta. "É impressionante a frieza desse doente mental", afirmou.
O fantasma da violência sexual ronda as vítimas por muito tempo. O maior pavor, contam, é o medo de ter adquirido alguma doença sexualmente transmissível. "Seis meses depois, continuo fazendo exames para confirmar que não tenho nada mesmo", diz a estudante J.G., 20, outra vítima do "maníaco do Jabaquara".
Nos dias posteriores ao estupro, J. conta que dormia na sala de seu apartamento com a TV ligada e com uma faca ao lado. "Fiquei com mania de perseguição."
As consequências, para Fátima, também se estendem até hoje. Ela desconfia de qualquer homem desconhecido, inclusive em bares que frequenta. "É complicado até para paquerar. Não acredito que alguém que passe por essa situação volte ao normal algum dia."
Fátima e J.C. -uma profissional bem sucedida e outra estudante universitária-, mulheres de classe média, são exceções entre aquelas que denunciam a violência (leia texto acima).
"O que eu mais queria era ver esse homem preso para que outras mulheres não sofressem o que sofri", diz Fátima.



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