São Paulo, Sexta-feira, 10 de Setembro de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

EDUCAÇÃO
Professora do Instituto de Biociências é acusada de se apropriar de bolsa de estudos de estudante
Verba de pesquisa é desviada na USP

JOSIAS DE SOUZA
Secretário de Redação

O departamento de fisiologia do Instituto de Biociências da USP está em pé de guerra. Representação entregue ao procurador-geral de Justiça do Estado de São Paulo, Luiz Antônio Marrey, traz à tona a causa do conflito: a suspeita de desvio de verbas destinadas à pesquisa científica.
A representação encaminhada a Marrey acusa a professora Célia Regina da Silva Garcia de "desvio de dinheiro público" e de "falsificação de atestados de frequência" de um aluno, com o objetivo de se apropriar da bolsa de estudos do estudante.
O caso envolve quantias modestas: sumiram R$ 7.000, que deveriam ter sido usados na reforma de um laboratório. A bolsa de estudos desviada era de um salário mínimo. A professora teria recebido a bolsa por seis meses, o que totalizaria cerca de R$ 800.
O episódio escapou ao controle da cúpula da USP, que gostaria de tê-lo mantido nos limites do campus. Oito professores do departamento de fisiologia assinaram o documento entregue ao procurador.
Eles recorreram a Marrey por acreditar que a direção da USP queria abafar o caso, arquivando-o. Algo que o departamento jurídico da universidade nega (leia texto nesta página).
O embate nasceu da denúncia de quatro ex-alunas de Célia Regina encaminhada, por escrito, em junho de 98, ao professor José Eduardo Pereira Wilken Bicudo.
Chefe do departamento de fisiologia, Bicudo é um dos que assinam a representação entregue ao procurador Marrey. Leia no rodapé desta reportagem os nomes dos outros sete signatários.
Em julho de 98, o professor Wilken Bicudo encaminhou os depoimentos ao professor João Stenguel Morgante, então diretor do Instituto de Biociências da USP. Em setembro de 98, abriu-se uma comissão de sindicância interna.
Apurou-se que, de fato, a professora se apropriava de bolsa de estudos de um aluno chamado Flávio Henrique Beraldo. A bolsa fora concedida pela Coseas (Coordenadoria de Assistência Social), entidade vinculada à própria USP.
O aluno contou à comissão que acumulava a bolsa da Coseas com outra do CNPq.
Recebeu as duas simultaneamente por três meses. Depois, começou a "repassar a bolsa da Coseas "para o laboratório da professora" Célia Regina. Retirava o dinheiro do banco e "entregava pessoalmente" à professora ou "deixava na gaveta" dela.
O acúmulo de bolsas é ilegal, segundo o departamento de recursos humanos da própria USP. Em ofício, a Coseas anotou: "Neste caso (do aluno Flávio Henrique Beraldo), verificamos que houve falsa declaração de cumprimento das horas (...), o que caracteriza a utilização ilegal dos recursos (...)".
Ouvida pela comissão de sindicância, a professora reconheceu que recebia o dinheiro relativo a uma das bolsas de Henrique Beraldo. Dispôs-se a devolvê-lo. Disse que usava os recursos em compras para o laboratório. Não exibiu recibos que comprovassem as despesas.
Quanto à reforma do laboratório, que deveria ter sido feita com os R$ 7.000 que recebeu da Pró-Reitoria de Pesquisa da USP, Célia Regina disse que o engenheiro contratado não conseguiria cumprir os prazos da obra. Por isso, havia devolvido o dinheiro.
Segundo a versão da professora, o cheque estaria no arquivo de seu laboratório. Fez-se na mesma hora uma diligência. Nenhum cheque foi encontrado no laboratório. Acharam-se apenas R$ 950, em espécie.
A comissão de sindicância da USP reuniu-se 11 vezes. Foram quase 50 horas de trabalho. Encerrou as suas atividades em 28 de dezembro de 98. No relatório final, recomendou "a abertura de processo disciplinar para apuração de responsabilidades". Algo que, até o momento, não foi feito.
Antes de deixar a direção do Instituto de Biociências, o professor João Stenghel Morgante, substituído há duas semanas por Elizabeth Hösling, determinou que fosse feito o cálculo das bolsas recebidas indevidamente, para que Célia Regina as reembolsasse. E arquivou o caso. Daí o recurso dos professores da Fisiologia ao procurador Marrey, pedindo a apuração do Ministério Público.


Além de José Eduardo Pereira Wilken Bicudo, assinam a representação contra Célia Regina da Silva Garcia os seguintes professores: Carlos Arturo Navas Iannini, Gilberto Fernando Xavier, José Carlos de Freitas, José Guilherme Chaui-Berlinck, Marilene dos Santos Camponez Bianconcini, Nancy Marques Carneiro e Sílvia Cristina Ribeiro de Souza.

Texto Anterior: 110 casas são alagadas em SP
Próximo Texto: Professora nega irregularidade e diz que agiu de boa-fé
Índice

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.