São Paulo, sábado, 11 de abril de 1998

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LEIS
Prisão temporária requer fundamento consistente

EUNICE NUNES
especial para a Folha

Frequentemente, promotores de Justiça e juízes desrespeitam a lei quando se trata de pedido de prisão temporária. Os pareceres e decisões não têm fundamentação, são lacônicos, repetitivos e burocráticos (leia quadro abaixo).
Diz a Constituição que todas as decisões do Poder Judiciário serão fundamentadas, sob pena de nulidade. Diz também que ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem judicial escrita e fundamentada.
Além disso, o Código de Processo Penal e a lei nº 7.960/89 estabelecem critérios para todos os tipos de prisão cautelar (que é feita antes da decisão definitiva).
Apesar disso, promotores e juízes não obedecem aos preceitos legais. Eles escrevem frases sem conteúdo jurídico, quase sempre semelhantes e, assim, mandam pessoas para a cadeia.
Ao passar os olhos pelas manifestações do Ministério Público e pelos despachos judiciais que decretam prisões temporárias e preventivas, o que mais se lê é: "ante a gravidade dos fatos", "o fato causa desassossego à sociedade", "a necessidade imperiosa da medida".
E não há salvação imediata para quem se vê preso nessas condições. Um habeas corpus (medida usada para soltar quem está preso) demora, em média, de 40 a 60 dias para ser julgado em São Paulo.
"Essas decisões (não fundamentadas) são inconstitucionais. O tribunal tem derrubado isso, mas demora até 60 dias para fazê-lo. É muito tempo para deixar alguém preso sem motivo. Na prática, representam uma negação de justiça", afirma Luiz Flávio Borges D"Urso, advogado criminalista.
Antônio Sérgio Pitombo, também advogado criminalista, considera absurda a postura de promotores e juízes.
"Eles, mais do que qualquer outra pessoa, deveriam obedecer à lei e apresentar os motivos que os levam a pedir e a decretar a prisão de alguém. Mandar alguém para uma de nossas prisões, por um dia que seja, pode equivaler a uma condenação à morte. O juiz não pode ser leviano", observa.
"Concordo que as decisões devam ser fundamentadas. Acho uma pena que não seja assim, que a Constituição seja desobedecida", diz Sérgio Augusto Nigro Conceição, corregedor-geral da Justiça.
Nigro Conceição afirma que a corregedoria não pode interferir nas decisões dos juízes.
"A corregedoria só pode intervir na área administrativa. Por exemplo, se o juiz demora muito para decidir, nós pedimos informações e podemos instaurar inquérito administrativo para apurar o que ocorre", explica.
O coordenador das promotorias criminais de São Paulo, Mário Papaterra Limongi, argumenta que a prisão temporária é uma medida emergencial que se aplica aos delitos graves e deve ser excepcional.
"A natureza da prisão temporária não admite grandes argumentações. Normalmente, o promotor concorda com o pedido quando conhece o delegado (é ele quem faz o pedido) e confia no seu trabalho", afirma.



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