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São Paulo, segunda-feira, 11 de agosto de 2003

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RIO

Obra foi contratada sem licitação, com o argumento de que a superlotação nas cadeias exigia uma medida emergencial

Presídio pronto desde maio está vazio

MARCELO BERABA
DIRETOR DA SUCURSAL DO RIO
SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO

Pronta desde o dia 23 de maio deste ano, a Casa de Custódia Japeri (Japeri, a 60 km do Rio de Janeiro, na Baixada Fluminense), que custou R$ 5,12 milhões, está vazia. Ao contratar a obra, o governo estadual dispensou a licitação, sob o argumento de que era emergencial a situação carcerária da região metropolitana, com a superlotação das cadeias, e que seria preciso abrir vagas no sistema penitenciário.
Por meio da Secretaria de Segurança Pública, o governo também dispensou a licitação para as obras de mais duas casas de custódia -Bangu B e Bangu C-, ambas no complexo penitenciário de Bangu (zona oeste).
Como a Japeri, as unidades foram entregues em 23 de maio. Só que Bangu C não estava pronta, como revelou a Folha em 5 de julho. Falta água e não há mobília nos alojamentos e refeitórios. As guaritas, a 5 m de altura, não têm escadas de acesso. Mesmo assim, Bangu C tem cerca de 600 presos.
Das três casas de custódia, que custaram um total de R$ 14.547.236,98, só a Bangu B não apresenta problemas. A partir da conclusão da obra, a unidade foi ocupada pelos presidiários.
A análise dos processos das três casas de custódia, cedidos à Folha pelo secretário de Segurança, Anthony Garotinho, mostra que, sob a alegação de que a situação era "de caráter emergencial", o governo, em 11 de setembro de 2001, assinou com a Procuradoria Geral do Estado documento em que se comprometia a contratar de imediato, sem licitação, a construção das unidades.
À época, Garotinho (PSB) era governador. A construção de casas de custódia -para presos à espera de julgamento, que superlotavam delegacias- integrava seu plano na área de segurança.
Embora tenha sido alegada a emergência da situação, só no último dia de janeiro do ano seguinte -mais de quatro meses após a assinatura do compromisso- foi assinado o primeiro contrato, para a construção da Casa de Custódia Japeri. Os outros dois foram assinados em 4 e 6 de fevereiro.
Garotinho deixou o governo em abril para concorrer à Presidência. A sucessora, Benedita da Silva (PT), não priorizou as obras, que não chegaram a ser terminadas. Até que começaram as rebeliões.
Em 29 de novembro de 2002, Benedita assinou com o TJ (Tribunal de Justiça) convênio para a complementação das obras. O TJ liberaria R$ 4 milhões e assumiria as parcelas vencidas das dívidas do governo com as empreiteiras.
Mais uma vez sem licitação, a secretaria convidou em 5 de dezembro nove empreiteiras (três para cada obra) a apresentar propostas para a complementação das obras. No dia seguinte, as empresas enviaram propostas detalhadas e o governo fez a escolha.
A rapidez do processo surpreendeu o advogado Flávio Guberman, especialista em direito administrativo, consultado pela Folha. Segundo ele, não é comum, em apenas dois dias, acontecer o convite, o envio das propostas, a análise e a escolha.
"A rapidez do processo não combina com o detalhamento das propostas das empresas. Creio que o tempo era muito exíguo para a apresentação de propostas tão detalhadas", disse Guberman.
Embora a alegação para a dispensa de licitação tenha sido, outra vez, a suposta situação emergencial dos cárceres, os contratos só foram firmados em 2 de maio deste ano, cinco meses depois da assinatura do convênio com o TJ.
Assinaram os contratos dirigentes das empreiteiras e o coordenador-geral do Grupo Executivo do Programa Delegacia Legal, César José Campos, representante da secretaria. As obras são gerenciadas pelo programa.
O processo guarda mais uma surpresa. Em 23 de maio, o Programa Delegacia Legal emitiu o Termo de Recebimento Provisório das três obras. O termo é emitido quando faltam detalhes para o fim do serviço. Só que, no mesmo dia, o órgão expediu o Termo de Recebimento Definitivo. "É estranho que os termos provisório e definitivo tenham sido emitidos na mesma data. Ou está pronto ou não está", afirmou Guberman.
O fato é que em Japeri existe há mais de dois meses, fechado com cadeado e sem vigilante, um presídio pronto, com capacidade para 500 detentos. Segundo a Prefeitura de Japeri, governada por Carlos Moraes (PSB), aliado de Garotinho e da governadora Rosinha Matheus, ainda não houve a inauguração porque o Estado não levou móveis e equipamentos.
Além disso, de acordo com o secretário municipal de Governo, Esli Pereira, o único acesso à unidade precisa ser melhorado. A estrada tem trechos de 5 km sem pavimentação. Vira um lamaçal quando chove. As obras na estrada não têm data para começar.

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