São Paulo, sábado, 11 de dezembro de 2004

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LETRAS JURÍDICAS

Agora veremos a reforma na prática

WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA

Saiu o texto integral do que se tem chamado de reforma do Judiciário. O interesse de cada cidadão brasileiro em que o Judiciário funcione é permanente, mas predomina a desconfiança de que não funciona bem. Burocracia imensa e poucos juízes marcam a dificuldade, a contar da seleção de pessoal. No megauniverso de concorrentes aos concursos, a vocação para ser juiz é quesito quase ausente e inúmeros aprovados mostram a fraqueza do ensino superior em nosso país. O sistema concursal prejudica a seleção da experiência qualificada. Opta pelo conhecimento livresco.
Para ampliar a informação crítica do leitor, recolhi opiniões de magistrados em textos publicados pela imprensa ou saídos na internet. O ministro Humberto Gomes de Barros, do Superior Tribunal de Justiça, dizia, há não muito tempo, com sensibilidade e coragem, que "saber jurídico não é conhecer livros escritos por outros. Saber jurídico a que se refere a Constituição Federal é a sabedoria que a vida dá, gerada no estudo e na experiência...". O ministro criticou, na mesma oportunidade, outro mal, o dos julgamentos contraditórios em seu tribunal, que retiram a confiança da sociedade. Concluiu dizendo: "O avião do Superior Tribunal de Justiça está extremamente perdido". Comparou certos julgamentos à brincadeira da "banana" puxada por lancha nas praias brasileiras. Descreve curvas fortes e seus passageiros acabam caindo ao mar. A incerteza de julgados conflitantes é a "banana" que derruba a Justiça.
O ministro Sepúlveda Pertence, do Supremo Tribunal Federal, viu o Judiciário em falência. O desembargador paulista Mohamed Amaro mostra-se pessimista quanto ao futuro: em entrevista, assegurou que a "decantada reforma do Judiciário", tal como então se apresentava, não pode resolver o problema da Justiça oficial, cuja "crise não é de natureza constitucional, e sim de funcionalidade...". O mesmo desencanto foi revelado pelo desembargador Pascoal Nabuco, presidente do Tribunal de Justiça de Sergipe, ao dizer: "De nada ou quase nada se há de melhorar o Judiciário com a reforma aprovada pelo Congresso". Igual conclusão se tira de declaração recente do presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Luiz Elias Tâmbara, manifestando preocupação com o fato de o Judiciário ter-se transformado em apêndice do Executivo ao recordar julgamentos concessivos de intervenção nos municípios, derrubados pelo Supremo Tribunal Federal.
Publicado o texto final, constata-se que algumas posições serão reexaminadas. Servem de exemplo a promoção de merecimento pelo critério objetivo de produtividade e presteza no exercício da jurisdição, de não ser promovido o magistrado que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão. Predominado exclusivamente pelos mais antigos, o órgão especial dos tribunais com número superior a 25 julgadores passou a cobrir metade das vagas por antigüidade e metade por eleição pelo tribunal pleno. São vedadas as férias coletivas nos tribunais de segundo grau.
Mesmo sem reforma, há de ser reconhecido que pelo menos a Justiça Eleitoral vai bem, como se viu no recente pleito municipal, a grande eleição do povo. No Brasil, Sepúlveda Pertence, presidente do TSE, conduziu a eleição em paz. Em São Paulo, o presidente do TRE, Álvaro Lazzarini, foi o pulso firme do pleno sucesso alcançado. A Justiça Eleitoral não requer reforma. Como diz o povo, "se melhorar, estraga".


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