São Paulo, domingo, 12 de novembro de 2000

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Confiança leva à dispensa de camisinha

DA ENVIADA ESPECIAL A BELO HORIZONTE

Paulinha Sharon Stone tem 21 anos e há cinco trabalha como prostituta. Ela diz que sempre usa preservativo com os clientes. "Se não quiserem, não faço."
Com o namorado, porém, dispensa a camisinha. "Não tenho medo. Confio nele. Meus namorados não são do meio e nem sabem o que faço."
O último namorado descobriu que ela era prostituta depois de seis meses de relacionamento porque encontrou um cheque de um cliente.
Ela prometeu "sair da vida" e eles continuaram o namoro. Algum tempo depois, ela voltou a trabalhar e eles continuaram mais dois anos juntos. A relação terminou há três meses: "Brigávamos muito", diz.
Paulinha conta que também atende os clientes em uma boate e por meio de anúncio em jornais. Os clientes entram em contato pelo celular e pagam no mínimo R$ 100. Por noite, faz entre quatro e cinco programas, "no máximo".
Dinheiro é apontado como principal motivação para o trabalho. Ela teve um filho aos 16 anos, parou de estudar e foi trabalhar numa padaria, ganhando um salário mínimo e meio por mês.
No jornal, viu anúncios de casas de massagem procurando garotas para trabalhar como acompanhante. O salário oferecido era quase vinte vezes maior -cerca de R$ 2.400 por mês.
Na primeira casa que procurou foi informada de que não poderia trabalhar porque tinha menos de 18 anos. Falsificou a identidade da irmã e procurou outra casa, onde conseguiu o trabalho.
Menos de um ano depois, a mãe descobriu que ela fazia programas e a obrigou a parar. Passou então a trabalhar como auxiliar de serviços gerais num escritório de advocacia.
Quando completou 19 anos, Paulinha resolveu voltar para a "vida". "Minha mãe não aceitou e tive que sair de casa. Moro sozinha e meu filho mora com ela. Mando dinheiro para ajudar nas despesas deles."

Busca da intimidade
No que se refere à questão da resistência ao uso do preservativo com o parceiro fixo, a pesquisa realizada pelo Musa concluiu que a vontade de agradar o companheiro que não gosta de usar camisinha e a própria vontade de não utilizar o preservativo possuem o mesmo peso na decisão das prostitutas, com 32% de respostas cada.
Na opinião da presidente do Musa, Mônica Bara Maia, usar a camisinha com um cliente não é um problema porque, nesse caso, ela ajuda a manter uma distância desejável.
Porém, com o marido ou o namorado, a camisinha é vista como barreira à intimidade.
"Elas não querem usar a camisinha porque amam os parceiros e confiam neles. Elas buscam intimidade e segurança emocional e o uso da camisinha violaria a confiança que elas têm na relação."
Segundo a pesquisadora, nesse sentido as trabalhadoras do sexo apresentam o mesmo tipo de vulnerabilidade às DSTs que as mulheres monogâmicas.

Próxima batalha
Sheyla, 40, monitora do Musa na região onde Paulinha trabalha, afirma que conscientizar as meninas da necessidade do uso do preservativo nas relações com os namorados e parceiros fixos é a sua próxima "batalha".
"Elas dizem que não usam porque com o namorado é diferente. Elas precisam entender que, com o namorado, a afetividade é diferente, mas o risco é o mesmo que com o cliente."
"Respostas para trabalhar essas questões não são simples, pois envolvem o modo de construção da identidade e da sexualidade feminina e também as relações de gênero da sociedade", conclui a presidente do Musa.




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