São Paulo, domingo, 12 de novembro de 2000

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SAÚDE SEXUAL

Mulheres têm assessoria de médicos e psicólogos e são pagas para difundir informações sobre Aids e DSTs

ONG treina prostituta como agente de saúde

DA ENVIADA ESPECIAL A BELO HORIZONTE

Desde 1995, a organização não-governamental Musa, de Belo Horizonte (MG), utiliza profissionais do sexo, ou mulheres que já "batalharam", para educar e orientar outras prostitutas sobre como cuidar de sua vida sexual e reprodutiva e de sua auto-estima.
O método de educação por pares, segundo a ONG, seria o mais eficiente para programas de prevenção de Aids e doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) dirigidos a profissionais do sexo.
As monitoras são selecionadas na população local. No processo de seleção são avaliadas a habilidade de comunicação, a facilidade de adquirir conhecimentos e a capacidade de liderar.
As monitoras são permanentemente treinadas e acompanhadas por uma equipe mutidisciplinar que inclui médicos, psicólogos, sociólogos e educadores.
Elas recebem da ONG R$ 150 por mês para fazer este trabalho e para frequentar as reuniões semanais. São as monitoras de saúde que distribuem material informativo sobre Aids e DSTs, assim como cartilhas e preservativos recebidos através do Ministério da Saúde e das Secretarias de Saúde.
Há quatro anos, Cristina acumula o trabalho de prostituta com o de monitora de saúde na Zona Grande, área de prostituição da capital mineira.
Desde então, visita regularmente os hotéis da região, onde vai em cada quarto ensinar as mulheres sobre as formas de contaminação e de prevenção contra as DSTs.
Cristina é um ponto de referência para as "batalhadoras" da Zona Grande. "Muitas me procuram quando têm algum problema. Elas tiram dúvidas sobre sintomas de doenças, falam sobre problemas com clientes e contam as brigas com os namorados."
Apesar de ter de conciliar o trabalho num hotel da rua São Paulo com o atendimento às colegas, ela não reclama: "As mulheres aqui são muito carentes e muitas vezes não sabem expressar seu sofrimento. Não é um dinheiro fácil de ganhar como as pessoas falam".
A trajetória de Cristina é parecida com a de grande parte das prostitutas da região. Mãe solteira aos 16 anos, morava com a mãe e era assediada pelo padrasto.
Trabalhava como empregada doméstica quando ganhou um lote e material de construção. A patroa negou o pedido de empréstimo para construir a casa.
Uma colega que "batalhava" lhe "apresentou a zona". Quatro meses depois, sentindo-se constrangida, "largou a vida".
A opção definitiva pela "batalha" só aconteceu quando ela percebeu que não conseguiria um emprego que pagasse tão bem.
Sheyla, 40, trabalha há quase 25 anos na zona e também é monitora do Musa. Ela afirma que procura levar para as colegas a orientação que não teve. "Se tivesse, com certeza não teria tido cancro, chato nem sífilis."
Para Sheyla, o trabalho na região apresenta bons resultados. "O trabalho de conscientização para o uso do preservativo reduziu muito a incidência de DSTs. A gente só não consegue um resultado melhor devido à vulnerabilidade delas em relação ao namorado, às drogas e à necessidade financeira, que fazem com que deixem de usar o preservativo."
(Dulce Benigna Alvarenga)


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