São Paulo, domingo, 12 de dezembro de 2004

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Marido proíbe mulher de retomar curso

DA REPORTAGEM LOCAL

Já no final da primeira aula do dia, em uma sala da escola de Viçosa do Ceará (CE), Antônia Muniz, 26, começava a enxergar embaçado. Aos 14 anos, ela já trabalhava como doméstica para engrossar a renda da família, mas ainda assim insistia em freqüentar as aulas da segunda série do ensino fundamental.
"Forçava a vista, mas, na segunda aula, já não conseguia ver mais nada na lousa", lembra. "Não tinha dinheiro para exames ou para comprar óculos e acabei cansando. Larguei os estudos."
Antônia é uma das 12.604 pessoas entrevistadas no "Mapa das Crianças, Jovens e Adultos Fora da Escola". Integra os 48% de entrevistados que pretendem voltar a estudar, mas faz parte também daqueles para quem a relação de gênero é o principal impedimento ao retorno às aulas: seu marido não permite que ela volte à escola. "É ruim não ter estudado. Mal sei assinar meu nome e já perdi muita oportunidade de trabalho. Até hoje penso em voltar para a escola, mas meu marido não aceita."
Diferentemente de Antônia, sua irmã Edinete, 18, está na oitava série. A defasagem entre sua idade e a série (o ideal seria cursar a oitava aos 14 anos) se deve à insistência e ao gosto de Edinete pelos estudos. Como a única escola de Viçosa do Ceará tinha aulas apenas até a terceira série do ensino fundamental, Edinete resolveu, após concluir a série, voltar para a segunda para não parar de ir à escola. "Fiz a segunda e a terceira duas vezes para não ficar parada. Aí, fui para Fortaleza para poder continuar a estudar", conta ela.
Michele de Souza Vieira, 24, abandonou a escola de Perus (zona norte de São Paulo) neste ano. "Desanimei. Era ruim demais, faltava material e até cadeira para assistir às aulas."

Trabalho
Para Maria das Graças, 33, o problema foi o trabalho. Aos 23 anos, ainda na oitava série, Maria largou os estudos para trabalhar como auxiliar de escritório.
"Foi triste parar de estudar. Ainda hoje penso em voltar para escola. Acho que nunca é tarde para aprender, mas me falta a coragem de encarar os alunos mais novos e as matérias, que devem ter mudado muito", diz.
"Minha filha, que tem sete anos, não vai parar de estudar como eu, não. Estou prevendo até faculdade para ela, como eu queria fazer quando jovem. Não quero que ela seja como a mãe." (FM)


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