São Paulo, segunda-feira, 12 de dezembro de 2005

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LONGE DOS OLHOS

Às vésperas das férias, prefeito aluga fazenda a 23 quilômetros do centro para abrigar moradores de rua

Caraguá esconde mendigos de turistas

DANIELA TÓFOLI
ENVIADA ESPECIAL A CARAGUATATUBA

Entra o verão, saem os mendigos. A estratégia da Prefeitura de Caraguatatuba, no litoral norte de São Paulo, para afastar os moradores de rua dos milhares de turistas que vão passar as festas de fim de ano e as férias na cidade é a de tentar escondê-los. Para isso, o prefeito José Pereira de Aguilar (PSDB) alugou uma fazenda de 16 alqueires a 23 quilômetros do centro, cercada de mato por todos os lados e com ônibus apenas uma vez por semana.
O objetivo, afirmou em entrevista à Folha, é "dificultar a volta dos moradores de rua" e ver sua cidade "limpa". Como não pode obrigar os mendigos a viver na fazenda, contratou a Associação Terapêutica Vida Nova -entidade criada há cinco anos por um ex-morador de rua, Jéferson Moreira Junqueira, que é especializada em ajudar esse tipo de população- para tentar convencê-los a se mudar de vez.
A estratégia entrou em operação na quarta-feira e foi acompanhada pela Folha. Nesse dia, a van da Vida Nova que sai para o centro em busca de mendigos estava quebrada e apenas dois homens concordaram em ir para a Fazenda Santa Mônica, alugada pela prefeitura por R$ 1.500 mensais durante tempo indeterminado.
Até sexta-feira, com a van já em funcionamento, o número tinha passado para 17, sendo que quatro acabaram desistindo da fazenda, caminharam os 23 quilômetros e voltaram a dormir ao relento. Pelo caminho de terra, encontraram apenas muitos buracos, poucos casebres e nenhum vizinho. Apesar da desistência, Aguilar, eleito pela primeira vez prefeito de Caraguá, comemorou os primeiros resultados e diz que está feliz com a iniciativa.

 

Folha - Por que a iniciativa de colocar os moradores de rua em uma fazenda?
José Pereira de Aguilar -
A preocupação surgiu porque essas pessoas estavam vivendo em uma situação que a sociedade não podia aceitar. Estavam fazendo em público o que se faz dentro de quatro paredes. Era uma calamidade e ainda bebiam cachaça nas praias e nas praças durante todo o dia. Decidimos recuperá-los e tirá-los da cidade para poder oferecer uma vida digna. A melhor opção foi procurar um lugar onde pudessem ficar descontraídos, em contato com a natureza, como uma fazenda.

Folha - Então a distância do centro foi proposital?
Aguilar -
Foi. Já mantínhamos uma casa na região central para atender os moradores de rua que não estava resolvendo muito o problema. Eles só ficavam lá cinco, dez minutos, para tomar banho ou comer alguma coisa, e voltavam imediatamente para as calçadas. Estávamos sustentando os homens de rua na rua. Então, quis um local para dificultar a volta deles e está dando certo. Até agora, só quatro voltaram a pé. Hoje (sexta-feira), temos já 17 vivendo na Santa Mônica.

Folha - Por quanto tempo os moradores poderão ficar lá?
Aguilar -
Não tem prazo. Quero manter a fazenda por tempo indeterminado. Os que quiserem voltar ao mercado de trabalho, serão encaminhados para casas de recuperação, onde farão cursos de qualificação profissional, e tentaremos encontrar um emprego. Os que decidirem ficar na fazenda, poderão permanecer até quando quiserem.

Folha - Então a cidade vai estar de cara nova neste verão? Os turistas não vão ver mais moradores de rua?
Aguilar -
Os turistas e habitantes da cidade vão poder aproveitar mais Caraguatatuba. Reformamos duas praças que agora estão limpinhas, os turistas vão poder freqüentá-las. Antes, mesmo com a recuperação, nem dava para passar perto por causa da sujeira, do cheiro, era tão vergonhoso que não dá nem para explicar. Além dos moradores de rua, turistas e munícipes também saíram ganhando com esta iniciativa. Estou feliz não só por saber que a cidade vai ficar limpa como por poder salvar vidas.


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