|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LONGE DOS OLHOS
Às vésperas das férias, prefeito aluga fazenda a 23 quilômetros do centro para abrigar moradores de rua
Caraguá esconde mendigos de turistas
DANIELA TÓFOLI
ENVIADA ESPECIAL A CARAGUATATUBA
Entra o verão, saem os mendigos. A estratégia da Prefeitura de
Caraguatatuba, no litoral norte de
São Paulo, para afastar os moradores de rua dos milhares de turistas que vão passar as festas de
fim de ano e as férias na cidade é a
de tentar escondê-los. Para isso, o
prefeito José Pereira de Aguilar
(PSDB) alugou uma fazenda de 16
alqueires a 23 quilômetros do
centro, cercada de mato por todos
os lados e com ônibus apenas
uma vez por semana.
O objetivo, afirmou em entrevista à Folha, é "dificultar a volta
dos moradores de rua" e ver sua
cidade "limpa". Como não pode
obrigar os mendigos a viver na fazenda, contratou a Associação Terapêutica Vida Nova -entidade
criada há cinco anos por um ex-morador de rua, Jéferson Moreira
Junqueira, que é especializada em
ajudar esse tipo de população-
para tentar convencê-los a se mudar de vez.
A estratégia entrou em operação na quarta-feira e foi acompanhada pela Folha. Nesse dia, a van
da Vida Nova que sai para o centro em busca de mendigos estava
quebrada e apenas dois homens
concordaram em ir para a Fazenda Santa Mônica, alugada pela
prefeitura por R$ 1.500 mensais
durante tempo indeterminado.
Até sexta-feira, com a van já em
funcionamento, o número tinha
passado para 17, sendo que quatro acabaram desistindo da fazenda, caminharam os 23 quilômetros e voltaram a dormir ao relento. Pelo caminho de terra, encontraram apenas muitos buracos,
poucos casebres e nenhum vizinho. Apesar da desistência, Aguilar, eleito pela primeira vez prefeito de Caraguá, comemorou os
primeiros resultados e diz que está feliz com a iniciativa.
Folha - Por que a iniciativa de colocar os moradores de rua em uma
fazenda?
José Pereira de Aguilar - A preocupação surgiu porque essas pessoas estavam vivendo em uma situação que a sociedade não podia
aceitar. Estavam fazendo em público o que se faz dentro de quatro
paredes. Era uma calamidade e
ainda bebiam cachaça nas praias e
nas praças durante todo o dia. Decidimos recuperá-los e tirá-los da
cidade para poder oferecer uma
vida digna. A melhor opção foi
procurar um lugar onde pudessem ficar descontraídos, em contato com a natureza, como uma
fazenda.
Folha - Então a distância do centro foi proposital?
Aguilar - Foi. Já mantínhamos
uma casa na região central para
atender os moradores de rua que
não estava resolvendo muito o
problema. Eles só ficavam lá cinco, dez minutos, para tomar banho ou comer alguma coisa, e voltavam imediatamente para as calçadas. Estávamos sustentando os
homens de rua na rua. Então, quis
um local para dificultar a volta deles e está dando certo. Até agora,
só quatro voltaram a pé. Hoje
(sexta-feira), temos já 17 vivendo
na Santa Mônica.
Folha - Por quanto tempo os moradores poderão ficar lá?
Aguilar - Não tem prazo. Quero
manter a fazenda por tempo indeterminado. Os que quiserem voltar ao mercado de trabalho, serão
encaminhados para casas de recuperação, onde farão cursos de
qualificação profissional, e tentaremos encontrar um emprego. Os
que decidirem ficar na fazenda,
poderão permanecer até quando
quiserem.
Folha - Então a cidade vai estar de
cara nova neste verão? Os turistas
não vão ver mais moradores de
rua?
Aguilar - Os turistas e habitantes
da cidade vão poder aproveitar
mais Caraguatatuba. Reformamos duas praças que agora estão
limpinhas, os turistas vão poder
freqüentá-las. Antes, mesmo com
a recuperação, nem dava para
passar perto por causa da sujeira,
do cheiro, era tão vergonhoso que
não dá nem para explicar. Além
dos moradores de rua, turistas e
munícipes também saíram ganhando com esta iniciativa. Estou
feliz não só por saber que a cidade
vai ficar limpa como por poder
salvar vidas.
Texto Anterior: Acidente: Eles só viram tudo escurecer, diz filha de casal atingido por árvore Próximo Texto: "Só estou achando meio vazio", diz Antônio, 46 Índice
|