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WALTER CENEVIVA
Lei desnatura crimes hediondos
A descrença na punição justa talvez seja o maior estímulo para o crime, com o que sofre toda a sociedade
A LEI NÚMERO 11.464, de 28 de
março último, deu nova redação à lei sobre crimes hediondos, restringindo a distinção entre
estes e outros delitos. Os crimes hediondos vêm definidos no inciso
XLIII do artigo 5º da Constituição.
Inafiançáveis, insuscetíveis de graça
ou anistia, incluem a prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes
e drogas afins, terrorismo e os definidos na lei especial.
O assunto merece atenção nesta
sociedade aflita com a segurança
pessoal enfraquecida. A preocupação social se mostrou na pesquisa
que comprovou crescente apoio à
pena de morte, que nem seria invocada se a norma constitucional sobre crimes hediondos, com delitos
reconhecidamente providos de gravidade excepcional, fosse cumprida,
o que não acontece. Daí resulta o inconveniente estímulo à defesa da
pena de morte, agravado pela forte
tendência ao abrandamento das penas destinadas aos grandes delitos.
Um passo para diminuir a distinção entre hediondos e não-hediondos foi dada pelo Supremo Tribunal
Federal. Outro passo é o da Lei nº
11.464. Com ela, o artigo 2º da Lei nº
8.072 que, desde 1990, dispôs originalmente sobre a hediondez, foi modificado. A punição, antes cumprida
em regime fechado, passa a ter a
aplicá-lo apenas no início da segregação. A progressão foi permitida
após o cumprimento de dois quintos
da pena, se o apenado for primário.
Mesmo os reincidentes, não importa quantas vezes, foram lembrados pela generosidade do legislador.
Aplicou a progressividade, no
cumprimento da sentença, depois
de transcorridos três quintos do
tempo de condenação. Suponhamos
uma pena de 20 anos de prisão. O
réu primário, seja qual for seu delito,
poderá voltar às ruas após oito anos.
Já o reincidente terá de esperar um
pouco mais. Pensando novamente
em 20 anos de pena, ele poderá voltar às ruas em 12 anos.
Há uma vantagem a mais para o
delinqüente: o juiz pode suspender
os efeitos de sua sentença condenatória, se oferecida apelação. Isto é:
pode permitir, em decisão fundamentada, que o réu apelante continue em liberdade até que seu recurso seja julgado, o que, conforme o caso, pode demorar anos e anos.
Mesmo a prisão temporária, que
foi objeto da Lei nº 7.960/89, quando aplicada aos crimes hediondos
passa a ter prazo de 30 dias, prorrogável, no máximo por mais 30, mas
este só em caso de "extrema e comprovada necessidade".
A prisão temporária cabe quando
imprescindível para investigações
no curso do inquérito e em mais
duas alternativas legais: a do indiciado sem residência fixa e sem identidade esclarecida ou quando houver
fundada razão de que o detido possa
ser autor de vários crimes, entre os
quais os hediondos. Esgotado o prazo, deve ser liberado, mesmo que a
investigação não tenha acabado.
O caminho do direito parece direcionado para o abrandamento das
punições, o que justifica as queixas
dos que se vêem cada vez mais vitimados pela fraqueza do aparelhamento do Estado. A tendência é
preocupante, em particular porque
dá amparo evidente a criminosos
providos de mais recursos financeiros, com a possibilidade de terem
bons advogados. A descrença na punição justa talvez seja o maior estímulo para o crime, com o que sofre
toda a sociedade.
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