São Paulo, sexta-feira, 14 de maio de 2004

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SEGURANÇA

Grupo paulista pagou adiantado a cartel, mas manteve homem em cativeiro por 6 meses como garantia de entrega da droga

Boliviano vira refém em acordo com tráfico

SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL

Um boliviano de 31 anos foi mantido refém por traficantes brasileiros durante seis meses em troca do pagamento adiantado de meia tonelada de cocaína.
O refém pertence à quadrilha produtora da droga, na Bolívia, segundo a Polícia Civil paulista. Só seria libertado quando toda a carga negociada chegasse às mãos dos brasileiros. Se isso não acontecesse, seria assassinado.
Cinematográfica, a história não termina por aí. Após cinco meses de investigação e interceptações telefônicas, os policiais identificaram o chefe da organização criminosa: um preso.
Ele é Abdiel Pinto Rabelo, 49, irmão do ex-deputado federal Jabes Rabelo (PL-RO). Membro de uma das mais ricas famílias de Rondônia, Abdiel dava ordens aos comparsas por telefone, de uma cela da Penitenciária Nestor da Canoa, em Mirandópolis (607 km de SP), uma das que têm bloqueador de celular. A Secretaria da Administração Penitenciária disse que, instalados há mais de um ano, "os aparelhos já são suscetíveis a novas tecnologias".
"Esse é o primeiro caso [de troca de pagamento adiantado por refém] que flagramos no Brasil, mas tivemos registro de três casos, no ano passado, nos quais brasileiros foram reféns no exterior [um na Bolívia e dois na Colômbia] exatamente para que não houvesse o pagamento adiantado da droga", afirma Ivaney Caires de Souza, diretor do Denarc (Departamento de Investigações sobre Narcóticos). "A estratégia deve ter sido a saída possível com a redução do poderio dos cartéis."
A quadrilha foi flagrada ao receber um dos lotes dos 500 kg encomendados -que seriam distribuídos entre o eixo Rio-SP e o Norte do país. Seria um carregamento de 80 kg, dos quais a polícia localizou 5 kg.
Além do boliviano Marcos Antonio Suarez Barcaza, 31, foram presos Landerson Corrêa Rodrigues, 29, e Rafael Santana, 23.
Barcaza, que se diz agricultor em Beni, estava trancado em um cômodo no Jardim Júlia (zona sul). Rodrigues seria o segundo homem da quadrilha e foi preso em Diadema, num endereço que seria a base do bando. Santana é motorista, mas guardava a droga em sua casa, no Jardim Miriam. Todos, segundo a polícia, evocaram o direito de ficar em silêncio.
A carreira penitenciária de Abdiel começou em julho de 1991, quando ele e um de seus irmãos, Noabias, foram flagrados em um posto da rodovia dos Bandeirantes com 554 kg de cocaína.
Na ocasião, Abdiel carregava uma carteira de assessor parlamentar que lhe dava acesso livre às instalações do Congresso. O episódio culminou na cassação do mandato do então deputado federal Jabes Rabelo, irmão do acusado e supostamente envolvido na falsificação da carteirinha.
Desde então, ele protagonizou duas fugas espetaculares. Na primeira, em julho de 2003, foi resgatado de um consultório dentário de São Paulo por homens com metralhadoras e granadas.
Recapturado, ele fugiu em 2001, junto com três presos, serrando as grades de uma cela supostamente de segurança máxima da Polícia Federal em Porto Velho (RO).
Na ocasião, uma testemunha disse ao Ministério Público que Abdiel integrava o Terceiro Comando e que a facção era responsável pela encomenda de 500 kg de dinamite, com o objetivo de explodir o muro de uma penitenciária em Rio Branco (AC), onde o traficante estava pouco antes de ir para a PF. O carregamento, de fato, havia sido interceptado no começo daquele ano.


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