São Paulo, sábado, 15 de maio de 2004

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EDUCAÇÃO

Sem oferta de recursos para permanência do aluno na escola, instituição de cotas nas universidades pode ser frustrante

Manutenção de aluno carente é problema

DA REPORTAGEM LOCAL

Um dos pontos críticos da criação de cotas para alunos provenientes do ensino médio público pode ser resumido na frase da estudante Raquel Guerra, 22, do quinto ano da Faculdade de Medicina da USP, onde 90% dos calouros vêm de escolas particulares: "Custa caro estudar, mesmo que seja em faculdade pública".
Um atlas de anatomia custa R$ 350. Um estetoscópio, R$ 250. Trabalhar, nem pensar. Os cursos de medicina funcionam em tempo integral, com oito horas de aula por dia, durante seis anos.
De acordo com João Carlos Nogueira, subsecretário de Relações Institucionais da Seppir (Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial), o projeto de lei das cotas deverá ser acompanhado de um programa de incentivo à permanência dos alunos carentes.
Custo do programa, segundo Nogueira: entre R$ 50 e 60 milhões, a serem gastos em bolsas para o custeio de moradia, alimentação, transporte e material.
O orçamento foi baseado nas experiências da Universidade de Brasília e da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que já têm cota.
O projeto, no entanto, só cita políticas de permanência, sem especificar ações ou orçamento.
Também não está previsto um programa de reforço escolar para os egressos do ensino médio público, de modo a ajudá-los a acompanhar as aulas.
Outro ponto sensível diz respeito aos afrodescendentes. Na proposta do governo, uma parcela da cota reservada para a escola pública será destinada a negros e pardos. Para distribuir essas subcotas raciais, será usado o percentual de população negra e parda em cada Estado, segundo o censo demográfico.
Para José Augusto de Matos Lourenço, presidente do sindicato das escolas particulares de São Paulo -que moveu uma ação de inconstitucionalidade contra a proposta de cotas-, o projeto pode gerar distorções.
"O jovem branco da Bahia, um Estado de maioria negra, pode ir prestar vestibular em Santa Catarina, porque lá há poucos negros e o cálculo de vagas para os afrodescendentes deve dar mais chances aos brancos", avalia Lourenço.
Outra crítica refere-se à identificação, implícita no projeto de lei, entre "estudante de escola pública" e "estudante carente". "Alunos ricos podem, por oportunismo, matricular-se em escolas públicas só porque o acesso à universidade ficará facilitado", diz Lourenço. "Se não for especificado um critério socioeconômico para os alunos que entrarão nas cotas, vai virar uma bagunça generalizada." (LC e FM)


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