São Paulo, domingo, 16 de fevereiro de 1997.

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APOIO
Inspirada no Alcóolicos Anônimos, entidade está no Brasil há 28 anos, com 390 grupos que se reúnem semanalmente
Neuróticos Anônimos ajuda 8 mil no país

JUNIA NOGUEIRA DE SÁ
especial para a Folha

Pregado na mesa, um cartaz avisa, enfático na repetição das palavras: ``O que você ouve aqui, quem você vê aqui, quando você sair daqui deixe que fique aqui''.
Em volta da mesa, as 20 e poucas cadeiras estão ocupadas por todo o tipo de gente. Uma professora de educação física de 32 anos. Uma dona-de-casa de 77. Um militar passado dos 50, severo, porém sorridente.
Começa uma reunião do Neuróticos Anônimos, ou N/A, um dos muitos grupos de ajuda mútua, como eles se definem, inspirados no Alcoólicos Anônimos.
No Brasil desde 69, o N/A tem experimentado um crescimento significativo nos últimos anos. Desde janeiro, cartazes com o telefone do escritório central estão em todas as estações de metrô de São Paulo.
As reuniões são sempre iguais. Por duas horas, quem quiser pode falar para a pequena platéia sobre seus problemas. É comum ver que, aqui e ali, alguém abana a cabeça, concordando com o que ouve.
``Chamamos de `terapia de espelho''', explica uma das frequentadoras. ``Quando as pessoas percebem que os problemas delas não são só delas, se sentem melhor.''
Para frequentar as reuniões, basta ter vontade. Ninguém pergunta nome, idade, condição social. ``Uma das nossas mais fortes tradições é garantir o anonimato'', diz o coordenador do N/A em São Paulo, um funcionário público de 42 anos que preserva a identidade.
Certa vez, nos bastidores do programa ``Jô Onze e Meia'', três dirigentes do N/A tiveram de escolher: mostravam o rosto na TV e davam a entrevista, ou permaneciam anônimos -e não iam ao ar. ``Foi difícil, mas mantivemos a tradição'', conta uma das dirigentes. ``Jô Soares compreendeu e demos a entrevista de costas para as câmeras.''
Há, em São Paulo, 52 grupos que se reúnem uma vez por semana. Em todo o Brasil, eles são 390. Como não há inscrições, não se sabe quantas pessoas frequentam o N/A, mas estima-se que cheguem perto de 8 mil em todo o país.
Em abril, o N/A completa 28 anos de Brasil. Sua frequentadora mais antiga, 25 anos de reuniões semanais. Aos 77 anos, diz que foi analfabeta até os 52 e só aprendeu a ler para acompanhar os livros do N/A. ``Quando cheguei aqui tinha 26 medos. De avião, de escuro, de falar com pessoas mais cultas que eu. Hoje, me sinto quase curada.''

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