São Paulo, sábado, 16 de abril de 2005

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AMOR SEM LIMITES

Pai recorre à polícia para fazer estudante deixar favela onde estava havia 2 semanas no Rio de Janeiro

Por namoro, jovem troca Ipanema por morro

Marcelo Régua/Agência O Dia
A estudante T., que deixou o Turano depois de a polícia ameaçar invadir o morro para resgatá-la


DA SUCURSAL DO RIO

A garota de Ipanema subiu o morro. A estudante T., 17, há duas semanas mudou-se do famoso bairro da zona sul do Rio para morar no morro do Turano, no Rio Comprido (zona norte).
A família e a polícia suspeitam que ela tenha deixado Ipanema para viver com um namorado, possível traficante. O pai a achou no Turano e usou a pressão da polícia para trazê-la de volta. Ontem, T. deixou o Rio, por cerca de 20 dias, em busca de tranqüilidade.
"Ela fala que na favela estão suas amigas e que lá se sente melhor do que em Ipanema", disse o taxista Roberto, o pai de T., que prefere não revelar o sobrenome.
A adolescente sumira de casa havia duas semanas, quando foi a um baile funk no morro. Segundo o pai, ela e a irmã gêmea costumavam ir a bailes em favelas. Ultimamente, freqüentavam o Turano.
Avisado pela outra filha de que T. estava no Turano, Roberto foi à favela tentar convencê-la a voltar para a casa. Os dois conversaram, mas ela não retornou. Ele decidiu então pedir ajuda à polícia.
A menina contou que deixou o morro porque os amigos alertaram que a polícia iria resgatá-la. Ela afirmou que dormia em uma casa quando foi acordada por amigos, que a mandaram descer o mais rapidamente possível.
Não chegou a ocorrer uma ação de resgate, apesar de a polícia ter sido mobilizada. Na manhã de quinta, policiais foram para a entrada da favela. Caso a garota não surgisse, o Turano seria invadido.
O delegado Ricardo Dias Teixeira disse que mandou um recado aos traficantes por dois motociclistas da comunidade. Dez minutos depois a adolescente apareceu. Foi levada para a delegacia. Contou o que aconteceu e foi liberada. Ao delegado e à família, T. disse que o namorado, que identificou como Roberto, não era traficante.
A decisão de tirar a menina do Rio por cerca de três semanas, tomada pelo pai, teve apoio do delegado e do Conselho Tutelar (órgão da prefeitura para assuntos que envolvem menores). O delegado afirmou que a viagem é uma forma de proteger a adolescente.
Há alguns meses o conselho foi procurado pela mãe da menina, que se dizia incomodada com o comportamento dela.
Desde anteontem T. está sob a guarda do pai. Antes, vivia com a mãe e a irmã gêmea. Os pais são separados há 15 anos. Segundo o pai, o relacionamento dela com a mãe é ruim. A mãe não foi localizada ontem pela Folha.
Segundo o pai, T. disse que pretende voltar para o Turano quando completar 18 anos (ela acabou de fazer 17 anos neste mês).
Para o delegado, não há indícios de que a adolescente tenha integrado a quadrilha local do tráfico. "Ela nega que tenha trabalhado para o tráfico. Ela confunde marginalidade com rebeldia", disse o delegado. "A juventude de hoje tende a glamourizar o traficante."
Caso seja localizado, o namorado da adolescente poderá ser indiciado por rapto consensual (artigo 220 do Código Penal), que prevê uma pena de um ano a três anos de prisão. "A lei estabelece que ela ainda não tem o discernimento para entender o ato que cometeu", afirmou o delegado.

Tráfico
Para a polícia, T. inventou o nome do namorado para protegê-lo, pois seria vinculado à quadrilha de traficantes de drogas do morro do Turano. Quatro suspeitos de integrarem a quadrilha de traficantes do morro já foram identificados, segundo o delegado. A quadrilha é vinculada à facção criminosa CV (Comando Vermelho). Seu chefe é Robson Medeiros Braga, 33, o Binho.
Segundo o delegado, Binho recebeu há meses o traficante Luiz Cláudio da Rocha Mero, o Berola, 34, que havia deixado o morro do Cantagalo (Ipanema). A favela fica próxima ao endereço de T..
"Ela freqüentava o baile funk do Cantagalo. Depois que o Berola foi para o Turano, ela passou a freqüentar esse morro. Talvez o Berola tenha levado a equipe. Não acredito que tenha sido o Berola, que é muito gordo e feio", afirmou o delegado.


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