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LETRAS JURÍDICAS
Acidente do trabalho: jurisprudência preocupante
WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA
No julgamento de conflito negativo de competência
entre o extinto Tribunal de Alçada de Minas Gerais e o Tribunal
Superior do Trabalho, o STF (Supremo Tribunal Federal), na sessão do final de junho, mudou
orientação adotada dois meses
antes, na qual afirmara a competência da Justiça estadual para
julgar questões de dano moral e
material por efeitos de acidentes
do trabalho. No reexame do tema, o STF acolheu por unanimidade voto do ministro Carlos Brito, que, em substancial sustentação doutrinária e constitucional
resultou vencedor, pela competência da Justiça do Trabalho.
A decisão, independente da alta
qualidade dos pronunciamentos,
foi, em parte, estimulada por informações prestadas por magistrado do Tribunal Regional do
Trabalho da Terceira Região, sediado em Minas Gerais, em favor
da Justiça especializada em que
atua, afastando a civil, de competência reconhecida há decênios.
A nova opção do STF tem um
lado preocupante, pois, embora
pareça favorável aos trabalhadores, pode ser gravemente prejudicial para eles, como conseqüência
da avaliação estatística a qual os
ministros da Suprema Corte foram levados. Pense o leitor que se
a competência para aquelas questões acidentárias for mudada, isso significará que os respectivos
processos correrão apenas em varas do trabalho. Ora, o número de
varas do trabalho é incomparavelmente menor que o das varas
cíveis da Justiça estadual. Assim,
transferida a competência, o prejuízo dos trabalhadores decorrerá
da distância física entre eles, onde
quer que seja seu domicílio e a vara trabalhista, mais o agravamento do acúmulo repentino de
processos sobre as relações de emprego.
Tomemos o exemplo dos Estados de São Paulo e de Minas, os
quais em conjunto reúnem entre
55 e 60 milhões de habitantes, um
terço da população brasileira. Os
mineiros se distribuem em mais
de 850 municípios e os paulistas,
em quase 650. O município é a
unidade política na qual se dividem os Estados. A unidade judicial é a comarca. Em todos os Estados o número de comarcas, onde operam as varas judiciais e
seus juízes, é inferior ao de municípios. Mesmo em São Paulo há
pouco mais de 300 comarcas. Significa a existência de mais de 300
municípios sem um juiz ali residente, para questões cíveis ou criminais.
Em Minas há mais de 500 municípios integrados a comarcas,
cuja sede está em outro município. Na Justiça do Trabalho a restrição é maior, com suas 120 varas
especializadas, situadas em
maior parte na região metropolitana de Belo Horizonte. Em mais
de 700 cidades o trabalhador residente no município não terá acesso direto para questões acidentárias de dano moral ou material.
Ora, a distância até a vara do
trabalho em outro município
complicará e tornará mais lenta e
mais cara a defesa. Pense o leitor
que estamos falando do trabalhador doente ou acidentado, a contar de seu domicílio, sempre mais
próximo da vara cível que da vara do trabalho. Quanto maior a
distância a percorrer, na variada
disponibilidade de acesso por
meios públicos de transporte em
entradas de boa qualidade, será
maior a dificuldade do trabalhador.
Os motivos de técnica processual que inspiraram o STF a
transferir a competência para a
Justiça do Trabalho são expressivos. Seduzidos pela tese de que há
varas do trabalho em número suficiente pelo Brasil afora, os ministros parecem ter optado por
caminho destinado a prejudicar
grande número de trabalhadores
brasileiros.
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