São Paulo, domingo, 17 de janeiro de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Artesãos de Parintins fazem "fortuna" em barracões de SP

Treinados no festival do boi-bumbá, profissionais chegam a ganhar R$ 30 mil por trimestre de trabalho no Carnaval

Escolas estimam que 300 "parintins" estejam na cidade para a temporada; alguns dormem dentro dos carros alegóricos

DANIEL BERGAMASCO
DA REPORTAGEM LOCAL

Escultor de carros alegóricos em Parintins (AM) "desde curuminzinho", Waldemar Santos, 28, divide seu ano entre a pobreza e a riqueza.
De outubro até o Carnaval, dorme em alojamento improvisado no barracão da Dragões da Real, do Grupo de Acesso de São Paulo. Na cidade, só anda a pé e de trem e trabalha o dia todo, de domingo a domingo, incluindo os bicos que faz quando está de folga.
Quando, ao final de fevereiro, retorna ao Amazonas, a vida é outra. Ali, Santos é parte de uma elite invejada de parintinense que, pela experiência com robótica nos bonecos do festival dos bois Caprichoso e Garantido, dominou os barracões nos Carnavais do Sudeste nos últimos anos.
Nesta temporada, estimam as escolas, trabalham em São Paulo cerca de 300 "parintins" (chamados assim, como um substantivo contável). Os cachês começam em R$ 5.000 por um trimestre de trabalho, mas podem passar dos R$ 30 mil. Alguns dizem ganhar cinco vezes mais do que no Amazonas.
Na volta para casa, esse dinheiro se materializa em casas amplas, muitas com piscina e carros na garagem. O soldador Marlúcio Pereira Filho, 33, que neste ano trabalha na Gaviões da Fiel, do Grupo Especial, já construiu casa "com três quartos, dois banheiros e TV 29 polegadas". Ao regressar, vai se presentear com "uma TV de plasma" e com o luxo de não trabalhar no próximo festival de Parintins, que acontece em junho, para assistir de casa aos jogos da Copa do Mundo.
Como nos tempos de Serra Pelada, a conquista é muito suada. Nos barracões da Gaviões, onde passeiam ratazanas gordas como cachorros, alguns trabalhadores dormem em redes armadas dentro de carros alegóricos. Há também camas em uma casa alugada e alojamentos improvisados.
Só na escola, trabalham quase 40 "parintins". "Eles dão duro, até de madrugada, e gostam, não reclamam", diz José Braga, da direção da Gaviões.
O confinamento nos barracões deixa pouco tempo para conhecer a cidade. José Onofre, 31, em seu primeiro Carnaval em São Paulo, diz que seu único lazer à noite é na própria escola de samba, ouvindo músicas de bandas de forró, como Mastruz com Leite. Marlúcio, quando pode, vai a cinemas. "Gosto de efeitos especiais, para tentar reproduzir nos carros. Vi "Avatar" e fico pensando em como fazer aquele acabamento."
Descendentes de povos indígenas, eles se irritam com a "falta de informação" sobre seu Estado e não gostam de ser chamados de "índios". "Perguntam se andamos nus, se vivemos no mato. Não sabem nada", diz Waldemar Santos. "Respondo umas mentiras, digo que vou lançar feitiço e dar flechadas."


Texto Anterior: Maranhão: Justiça ordena reforma de prédios tombados que ameaçam ruir
Próximo Texto: Imagem rara de santa grávida é recuperada em Paraitinga
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.