São Paulo, sábado, 17 de abril de 2004

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LETRAS JURÍDICAS

Reforma do Judiciário: ainda a carreira

WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA

A posse recente do ministro Edson Vidigal na presidência do STJ - Superior Tribunal de Justiça e a aposentadoria prevista do ministro Maurício Corrêa, presidente do STF - Supremo Tribunal Federal, têm estimulado o exame do projeto de emenda constitucional para a reforma do Judiciário, que por si só já é matéria de importância para a cidadania. As diversidades de posição nas novas lideranças, em face de seus antecessores, acrescentam sabor ao debate, especialmente sobre a súmula de efeito vinculante.
Os dirigentes das cortes superiores nacionais -e seus companheiros nos outros tribunais- avaliam cada item da reforma nos grandes temas e mesmo em assuntos aparentemente prosaicos, mas de relevo direto para os juízes. Entre as disposições do projeto que agitam a magistratura está a proibição de promoção do juiz que injustificadamente retiver autos em seu poder além do prazo legal ou sem despacho ou decisão. A clássica desculpa para o retardamento, por excesso de serviço, não será aceita.
É de conhecimento dos que vivem o Judiciário que a remoção a pedido ou a permuta entre magistrados em comarcas de igual entrância se presta para a ultrapassagem dos obstáculos à proteção política. Se a emenda for aprovada, talvez se interrompa o abuso.
No rol das medidas que parecem menos importantes (mas não o são), a emenda permitirá, por exemplo, a delegação pelo juiz a servidores que trabalhem sob suas ordens da prática de certos atos processuais de administração sem caráter decisório. Pode parecer estranho que o julgador delegue a funcionários atos próprios de sua nobre função. Na verdade, isso acontece há bom tempo pelo Brasil afora. Já é e será erro evidente se o magistrado não estiver atento à ação de seus auxiliares.
A emenda permitirá corretamente que, quando o sigilo garanta a preservação do direito à intimidade, o interesse público à informação não seja prejudicado. Outras regras se voltam predominantemente para a classe judicial. O inciso XI do artigo 93 dirá que, em tribunais com número superior a 25 julgadores, o órgão especial (substitui o tribunal pleno nas funções administrativas e jurisdicionais) terá de 11 a 25 membros. Será novidade o provimento de metade das vagas desse órgão por antiguidade e metade pelo voto da maioria de todos os componentes do tribunal, e não apenas pelos do próprio órgão especial. É democratizante. O inciso XII vedará as criticadas férias coletivas ou recesso nos tribunais de segundo grau.
A tentativa da proporcionalidade obrigatória entre o número de juízes e a efetiva demanda judicial da respectiva população é bem pensada. As desproporções atuais parecem absurdas. Para os cerca de 2.000 juízes do Estado de São Paulo, há quase 150.000 advogados, algo como 1 juiz para 75 advogados. Isso, além dos promotores. É evidente que a massa de trabalho produzida por eles não é absorvida pelos julgadores, sendo mais uma causa do atraso muito grande no pronunciamento judicial em São Paulo.
Fala-se de Estados nos quais não se quer aumentar o número de juízes das varas de primeiro grau porque a produção acrescida aumentaria o engarrafamento e o trabalho nos respectivos tribunais. Como se vê, é uma parte mínima da reforma projetada, mas vale a pena acompanhar seus pontos essenciais, nem sempre presentes nas manchetes.


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