São Paulo, sábado, 17 de maio de 1997.



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LETRAS JURÍDICAS
Improviso eleitoral

WALTER CENEVIVA
da Equipe de Articulistas

Há um provérbio antigo cuja autenticidade e cuja origem ignoro, dizendo: na política e na guerra, mentira como terra. Entre nós o provérbio tem sido verdadeiro, mas esse, na atualidade, não é o principal de nosso males eleitorais.
Nosso mal está menos nas mentiras e mais na insegurança da aplicação do direito resultante do casuísmo de leis exclusivas para cada pleito, ano após ano.
A avaliação do tema parte da realidade constitucional em que vivemos, retratada no artigo 16 da Carta de 1988. O dispositivo delimita o âmbito das variáveis legislativas. Nele está expresso que qualquer lei alterando o processo eleitoral entra em vigor na data de sua publicação, mas não se aplica à eleição que ocorra até um ano depois do início da vigência. Trata-se de regra muito boa, pois dificulta o casuísmo, embora não o impeça. Neste momento, o debate sobre a emenda constitucional da reeleição é um dado a mais para complicar as perspectivas do processo eleitoral, no ano que vem.
Os pleitos referentes ao Executivo nos níveis federal, estadual e municipal estão na corda bamba de debates parlamentares, no exame do projeto para as eleições de 1998.
Descontada a incerteza da emenda, a lei das eleições para presidente, governadores e prefeitos deverá estar pronta dentro de aproximadamente quatro meses. Perguntará o leitor: e o Código Eleitoral, como é que fica? O Código Eleitoral está em vigor há mais de 30 anos, mas superado -e, em grande parte, esquecido. Ano após ano, ao se aproximar novo pleito, o Código é posto de lado, na espera da lei especial, que o Parlamento sempre demora para aprovar.
São questões específicas, são casuísmos políticos a estabelecerem condições para a propaganda, a divulgação das pesquisas e assim por diante. Tem sempre destaque a costumeira hipocrisia sobre o financiamento das campanhas, com normas que todos sabem que não serão respeitadas.
Conviria evitar o grave erro das leis eleitorais especiais. Temos experiência suficiente para reformar o Código, dando permanência à legislação. Um dos melhores alimentos para o bom direito é sua estabilidade. Contudo, o Congresso Nacional não tem dado atenção a essa tarefa. Falta com seu dever essencial.
Fui autor de um capítulo no livro "Direito Eleitoral" coordenado pela professora Carmen Lúcia Antunes Rocha e pelo ministro Carlos Mário da Silva Velloso (Del Rey, 392 páginas). Nele destaquei "as deficiências relacionadas com os procedimentos eleitorais conhecidos e admitidos por lei, no Brasil. São deficiências a serem destacadas, quando se pensa no enorme fosso entre a teoria e a prática nas eleições brasileiras. Fosso alargado pela sucessão de leis específicas, ano após ano, retardando a imprescindível busca de solução estável que supere as deficiências anotadas."
Ponderando que "as muitas leis são transitórias, mas o assunto é permanente, no primeiro nível dos que interessam à democracia brasileira" insisti na conveniência de atualizar o Código Eleitoral, nele inserindo as modificações sugeridas pelo progresso científico e as alternativas criadas pela prática democrática.
Seria bom lenitivo para as culpas da omissão congressual se, pensando no aprimoramento da democracia brasileira, surgisse o novo Código, depois de amplo debate, que esgote o aprofundamento dos temas envolvidos, abandonando o regime de improvisações -entre triste e ridículo- que nos vem perseguindo há anos.



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