São Paulo, domingo, 17 de maio de 1998

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Pai de assassino é morto por vingança

da Reportagem Local

Não é preciso procurar muito, na periferia de São Paulo, para encontrar casos de negros que tenham sido vítimas fatais de algum tipo de violência. Em uma rua da Vila Brasilândia, noroeste da cidade, bastaram algumas perguntas a pedestres para encontrar, em menos de uma hora, Elisângela Oliveira de Aguiar, 18, órfã de pai.
O assassinato do pai de Elisângela, ocorrido há oito meses, não teve nenhuma motivação racista, mas ilustra o cotidiano violento onde vive a maior parte da população negra.
O desentendimento que acabou com sua vida, aos 44 anos, começou em um campo de futebol, entre seu filho P., que hoje tem 17 anos, e um colega.
Os dois discutiram por causa de uma jogada e P. acabou matando o colega, que tinha disparado dois tiros, sem atingi-lo.
À noite, quando um grupo de homens armados bateu à porta da casa de P., o rapaz não estava. Seu pai foi morto quando abriu a porta. Sua mãe, baleada, sobreviveu.
Atendida no hospital público local, teve o intestino perfurado por um dreno, enfrentou uma infecção generalizada e ainda tem sequelas. P. acabou preso e hoje cumpre pena na Febem. Elisângela tinha acabado de ter um filho, Kaíke, hoje com 8 meses. O pai, casado, não assumiu a criança.
Elisângela não conhece muito bem sua ascendência, e não sabe dizer quais antepassados seus foram escravos, há cem anos. Mas já conheceu a discriminação.
"Vi um anúncio de emprego em uma loja. Quando entrei, a funcionária nem perguntou se eu tinha estudo, nem nada, e disse que a vaga já tinha sido preenchida. Eu ia saindo quando chegou uma mocinha branca. Fiquei ali para ver e ela ganhou a vaga."
Apesar dos 18 anos, Elisângela só estudou até a 6ª série. Desempregada, não vê futuro para seu filho. "Quero que estude. Além de ser preto, se não tem estudo, não vale nada."
Ao seu lado, no dia da entrevista, estava A.L., 16, que fazia uma visita. O rapaz, também negro, conheceu o irmão de Elisângela na Febem, onde foi parar por um roubo e de onde fugiu há alguns meses. Sem documentos, ele não pode trabalhar. "Vivo de ajuda, mas não roubo mais." (RV)



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