São Paulo, domingo, 18 de julho de 2004

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ADMINISTRAÇÃO

A Folha tentou por três dias ouvir a versão oficial sobre o índice de correção da dívida ativa; a resposta foi "IPCA"

Prefeitura se recusa a esclarecer contas

DA REPORTAGEM LOCAL

A Prefeitura de São Paulo se recusou a esclarecer que cálculos fez para atualizar a dívida ativa e não quis checar as contas feitas pela Folha nem comentar a existência de indícios de irregularidade em seus balanços. A única resposta que a reportagem obteve da prefeitura foi que o índice de atualização dos créditos é o IPCA. Alertada para o fato de a conta não coincidir com a publicada, a administração petista não quis dar esclarecimentos adicionais.
A busca por uma resposta durou três dias. O primeiro contato, na terça-feira, foi com a Secretaria das Finanças, cujo titular assina os balanços. A assessoria de imprensa disse que caberia apenas à Secretaria dos Negócios Jurídicos responder sobre dívida ativa.
A reportagem insistiu para falar com o assessor-geral do Orçamento, José Police Jr., pedindo que ele explicasse o balanço e os motivos pelos quais a dívida ativa tivera tamanho crescimento. A assessoria negou a entrevista.
Com a Secretaria dos Negócios Jurídicos, a interlocutora da Folha foi Rosane Toledo de Freitas, assessora de imprensa do secretário, Luiz Tarcísio Teixeira.
Na terça, Freitas foi informada de que o jornal estava fazendo uma reportagem sobre a auditoria feita pelo Tribunal de Contas do Município (TCM) nas contas de 2003. Foram pedidas explicações para o fato de a dívida ativa saltar de R$ 14 bilhões para R$ 24 bilhões em um ano.
A assessora perguntou se a reportagem era sobre a auditoria. A Folha esclareceu: "Não necessariamente. É sobre o aumento da dívida, e os dados são do balanço". Foi dito ainda que a atualização monetária dos créditos deveria ter sido pelo IPCA, mas se deu por um índice não discriminado.
"E isso acaba alterando drasticamente o balanço, porque ele deveria mostrar um patrimônio negativo de bilhões e traz um patrimônio positivo", disse a Folha, fornecendo os dados de ativo e passivo à assessoria da secretaria.

Relatório
A assessora telefonou para o jornal no final da tarde de terça. "Falei com o meu chefe, e ele deu a mesma resposta de ontem [segunda, quando o TCM aprovou com recomendações as contas da prefeitura]: "A gente não tem o relatório [do TCM]'", disse Freitas.
A reportagem lembrou-a então de que a primeira auditoria do tribunal que aponta o problema se refere a dados de 2002 -portanto, disponíveis há mais de um ano- e se ofereceu para passar as informações por fax. A assessora disse que não adiantaria. A Folha, então, pediu que a prefeitura, pelo menos, indicasse o índice usado para corrigir a dívida ativa.
"Todos os economistas que ouvimos até agora dizem que há indício de fraude no balanço. Vocês não querem mesmo explicar?", questionou a reportagem em nova tentativa para obter um esclarecimento do poder público.
Freitas disse que já havia dito tudo isso ao "chefe", mas que tentaria mais uma vez saber como havia sido reajustada a dívida ativa.
Horas mais tarde, ao telefone ela voltou a dizer que não conseguira nada. Freitas se comprometeu então a obter da administração uma resposta explicativa no começo da tarde de quarta-feira.
"Vou dizer que vocês precisam de explicações, porque estão dizendo que a coisa é artificial. Vou direto no contador e pergunto quem pode me explicar isso direitinho", afirmou a assessora.
Na quarta, diferentemente do combinado, a Folha só localizou a funcionária da prefeitura por volta das 17h30. Na ocasião, ela informou que o índice usado para atualizar a dívida ativa é o IPCA, de acordo com a lei 13.275/2002.
A reportagem disse que a conta não bate e insistiu por quase cinco minutos para ver a memória de cálculo da atualização, repetindo que as avaliações coletadas pelo jornal são de que o balanço municipal pode estar distorcido.
"Vocês não querem mostrar que estão certos?", questionou o jornal. Freitas disse que tentaria de novo. Por volta das 20h ela informou que não teria mais nenhuma informação. "A resposta é aquela: o índice é IPCA", afirmou, em recado gravado na secretária eletrônica da Folha.
Na quinta-feira pela manhã, a reportagem disse que iria à secretaria para tentar mostrar os dados ao secretário Luiz Tarcísio Teixeira, pediu à assessora que ele atendesse a reportagem, reafirmando tudo o que havia sido dito anteriormente e mandando todos os cálculos para o e-mail de Freitas com pedido de análise das contas.
No final da quinta-feira, ela gravou a seguinte mensagem na secretária eletrônica do jornal: "O secretário não pode atender. E a resposta final da prefeitura é a mesma que já foi dada: IPCA. Só vamos nos pronunciar após ter acesso à documentação do TCM. Boa noite".
Todas as conversas estão gravadas. O Tribunal de Contas do Município também não comentou a aprovação das contas.
(SÍLVIA CORRÊA)


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