São Paulo, domingo, 18 de julho de 2004

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ADMINISTRAÇÃO

Procurador analisa caso hipotético e indica leis feridas e penas para eventual irregularidade de balanço

Maquiar dados pode ser improbidade

DA REPORTAGEM LOCAL

Alterar dados de balanço público pode ferir ao menos os artigos do Código Penal que tipificam a falsidade ideológica e a contratação ilegal de operação de crédito. Neste caso, a lei exige que a irregularidade implique mudança de limites orçamentários legais.
O artifício pode também caracterizar crime de responsabilidade, crime político-administrativo e, por fim, improbidade administrativa (má gestão).
Provada a infração, as penas recaem também sobre o chefe do Executivo -o prefeito da cidade na ocasião da ocorrência das irregularidades- e podem chegar a cinco anos de prisão e cassação do mandato (veja quadro ao lado).
A análise do enquadramento da alteração da dívida ativa na legislação brasileira foi feita, a pedido da Folha, pelo procurador de Justiça Airton Florentino de Barros, presidente do movimento Ministério Público Democrático.
Barros fez o estudo de um caso hipotético no qual um tribunal de contas tenha detectado que o prefeito ou prefeita inseriu no Orçamento da cidade ou em sua prestação de contas declaração falsa ou diversa da que deveria constar, como créditos e receitas inexistentes, por exemplos.
"O tribunal deve encaminhar prova desses fato à Câmara Municipal e ao Ministério Público", escreve Barros em sua análise.
O Tribunal de Contas do Município (TCM) manda, por lei, a auditoria das contas da Prefeitura de São Paulo para os vereadores. Os documentos ainda não foram encaminhados à Promotoria.

Código Civil
À análise de Barros, o tributarista Lázaro Rosa da Silva, autor do livro "Código Civil para Contadores", acrescenta um item. Para ele, alterar balanço -ainda que do poder público- fere as regras contábeis do novo Código Civil.
"A lei é clara: o balanço tem de expressar a verdade", diz Silva. "E o poder público está sujeito às mesmas normas cíveis e contábeis que as empresas privadas."
Ele se refere ao artigo 1.188 do código em questão, segundo o qual "o balanço patrimonial deverá exprimir, com fidelidade e clareza, a situação real da empresa e, atendidas as peculiaridades desta, indicará, distintamente, o ativo e o passivo".
Para o procurador de Justiça, porém, "a previsão do Código Civil é da esfera do direito privado e só deve ser aplicada ao direito público suplementarmente".
Ou seja: pode servir de apoio na falta de regras específicas, o que não seria o caso.

Reação na Câmara
O advogado Floriano de Azevedo Marques Neto, especialista em direito público, avalia que o resultado de uma suposta alteração de balanço é ato de má-fé contra acionistas e credores. No caso de uma prefeitura, a irregularidade se daria contra a fé pública -munícipes, fornecedores e credores.
"O fato é que o poder público não é protestado, não tem falência, e os governantes se escondem atrás disso", avalia Silva.
Na Câmara Municipal, a oposição promete se movimentar. O vereador Ricardo Montoro (PSDB), cujos técnicos também revisaram os cálculos da reportagem antes de o parlamentar se pronunciar sobre o caso, disse que pedirá a convocação do secretário das Finanças, Luís Carlos Fernandes Afonso, para explicar a aparente irregularidade no balanço. Para isso, 28 dos 55 vereadores devem concordar com o convite.
"Eles estão fazendo de tudo para esconder a má gestão das finanças da cidade e os sucessivos resultados negativos, chegando ao absurdo de manipular os dados para enganar a população", disse Montoro. Além da convocação, o vereador deve fazer uma representação ao Ministério Público para que o caso seja investigado. (SÍLVIA CORRÊA)


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